23/04/2009 VALOR ECONÔMICO
No segundo semestre de 2008 as operadoras de telefonia GVT e Nextel começaram a atuar na Bahia. Atraídos pela venda de pacotes e tarifas mais competitivas, antigos assinantes trocaram seus planos, mudaram de companhia telefônica e ficaram com uma conta mais barata ao fim do mês. Bom negócio para os consumidores. Nem, tanto, pelo menos de imediato, para a Secretaria da Fazenda estadual.
Com contas menores, o ICMS arrecadado sobre serviços de telecomunicação encolheu mais do que o restante da arrecadação. "A migração de consumidores para os novos fornecedores fez a participação da arrecadação do setor cair", diz o secretário da Fazenda da Bahia, Carlos Martins Marques Santana.
A secretaria detectou que houve troca de fornecedores feita pelos usuários e queda de preços em função da maior concorrência, ocasionando decréscimo acima do esperado na arrecadação no setor, acentuando o efeito de redução em razão do nível de atividade. A queda em março foi de 15% nominais na comparação com igual período de 2008. No trimestre, a perda foi de 8%. Para Santana, o desempenho do segmento deve afetar a participação do segmento na arrecadação total de ICMS. No ano passado, a fatia do setor era de 11,2%.
O fenômeno que a Bahia vive agora não é um caso isolado. Nos últimos anos, o serviço de telecomunicações se transformou, com a ampliação do mercado, oferta de novas tecnologias e acessibilidade maior. Mas, mesmo com esse crescimento, a competitividade maior no setor, que possibilita ao usuário a troca de fornecedor, acabou reduzindo a participação dos serviços de telefonia na arrecadação total do imposto. Em 2005, o ICMS sobre comunicação representava 12,8% da arrecadação total do imposto em todo o país. Em 2008, a fatia caiu para 11,9%. Um decréscimo de praticamente um ponto percentual, que significa R$ 1,92 bilhão na arrecadação do ano passado. Os dados são do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
Nos Estados em que os serviços de comunicação já estavam mais estruturados também houve a redução de participação. Em São Paulo, a redução da fatia do segmento foi de 13,4% para 11,9%, num decréscimo de 1,5 ponto percentual que significa pouco mais de R$ 1 bilhão de ICMS em 2008. Em Minas Gerais, a queda foi de 11,4% para 10,2%. No Rio Grande do Sul, de 13,6% para 10,7%.
Embora a fatia dos serviços de comunicação no ICMS tenha ficado menor, não há dúvida de que o setor cresceu no período. A redução na participação do imposto reflete, na verdade, um período de mudanças profundas no perfil do serviço de telecomunicação, o que gerou maior competitividade de tarifas. Em pouco mais de três anos, o número de telefones móveis no Brasil aumentou de 86,2 milhões, em 2005 para os atuais 152 milhões. No mesmo período, as conexões de banda larga passaram de 3,8 milhões para mais de 10 milhões.
Enquanto isso, o número de telefones fixos em uso subiu de 39,8 milhões para pouco mais de 41 milhões. E esse crescimento deve ser atribuído às chamadas empresas autorizadas - como GVT e Net (que oferece telefonia fixa por meio da Embratel, sua acionista) -, que atraíram clientes com pacotes mais flexíveis e que não cobram assinatura básica. As concessionárias de telefonia fixa - Telefônica, Oi e Brasil Telecom (esta última comprada recentemente pela Oi) - viram encolher o número de linhas em serviço na sua base de assinantes.
A transformação alterou também as características da tributação no setor de telecomunicações. A arrecadação cresceu como um todo porque o uso dos serviços de telefonia aumentou. De 2005 a 2008, a arrecadação do setor cresceu de R$ 19,3 bilhões para R$ 25,5 bilhões. No entanto, a tributação passou a ser, proporcionalmente, menos atrelada à telefonia fixa tradicional, que tem tarifas regulamentadas pela Agência Nacional de Telecomunicação (Anatel) porque é considerada um serviço em regime público. Em vez disso, cresceu a participação dos serviços cujos preços não são corrigidos por regras da agência.
"A arrecadação tributária no setor tem aumentado nos últimos anos, já que as pessoas estão usando mais serviços de telecomunicações e a base de clientes das operadoras cresceu muito", diz José Luís Oliveira de Souza, diretor da consultoria Teleco. Ele lembra, porém, que a arrecadação se deslocou da telefonia fixa para outros serviços.
"Os serviços se ampliaram e geraram aumento de arrecadação, mas um crescimento menor do que o recolhimento do ICMS nas demais atividades. O que explica isso é a competitividade, que reduziu os preços do serviço de uma forma que superou o efeito da ampliação de demanda", diz o especialista em carga tributária, Amir Khair.
Em São Paulo, é evidente a elevação da arrecadação na telefonia. Segundo a Fazenda paulista, a de 2005 a 2008 a arrecadação de ICMS sobre as contas de telefone fixo aumentou de R$ 5,4 bilhões para R$ 6,6 bilhões. No mesmo período, o recolhimento na telefonia móvel cresceu de R$ 1,2 bilhão para R$ 1,9 bilhão. Enquanto a arrecadação sobre os serviços móveis aumentou em 58,3%, a da telefonia fixa cresceu 22,2%. Com a evolução, a participação dos serviços móveis na arrecadação de ICMS sobre telefonia em São Paulo aumentou de 18,61% para 29,95%. No mesmo período, a participação dos serviços de comunicação na arrecadação total do imposto paulista caiu em 11%.
Para Amir Khair, a mudança do setor e seu impacto na arrecadação de ICMS deve começar a ser acompanhado com mais cuidado pelos Estados. Ele acredita que em razão da ampliação e crescimento de demanda, o recolhimento não deve cair, mas há uma alteração importante no perfil de tributação e arrecadação do serviços.
O serviço de telefonia é importante para os Estados porque integra os chamados preços administrados, ao lado dos serviços de energia elétrica e da venda de combustíveis e derivados. E são exatamente os preços administrados que seguram a arrecadação de ICMS em momentos de desaceleração econômica.