11/05/2009 ZERO HORA
Em reação a uma nova denúncia, feita pela revista Veja, a governadora Yeda Crusius afirmou no final da manhã de sábado se tratar “de mais um capítulo da mesma novela”. A governadora questionou a veracidade e lançou suspeitas sobre a viúva do ex-assessor Marcelo Cavalcante, Magda Koenigkan (veja na página 8), e sobre o lobista Lair Ferst, sugerindo que ele teria vendido gravações.
A revista que chegou às bancas confirmou um temor que rondava o Piratini: Veja diz ter tido acesso a gravações em que Cavalcante, encontrado morto em 17 fevereiro, em Brasília, relata irregularidades na campanha e no governo. A reportagem diz ter ouvido uma hora e meia das 10 horas de diálogos mantidos entre Cavalcante e Lair, um dos pivôs do escândalo do Detran. Os áudios, segundo a revista, trazem três casos com indícios de suposta corrupção.
Na manhã de sábado, antes de se pronunciar, Yeda se reuniu com três de seus principais secretários para estudar a reportagem e afinar o discurso. Magda afirmou que as gravações são conversas de “barzinho” entre seu marido e Lair. De acordo com Cavalcante, Yeda teria se beneficiado de dinheiro do caixa 2 depois do pleito. O ex-assessor conta que ele próprio coletou dinheiro em duas empresas fabricantes de cigarros: R$ 200 mil da Alliance One e R$ 200 mil da CTA-Continental. O ex-assessor disse que teria entregue os recursos a Carlos Crusius, então marido da governadora. Os executivos das empresas negaram o fato.
Segundo Magda, os R$ 400 mil teriam sido usados num pagamento da casa de Yeda “por baixo do pano”. A declaração reabre mais uma ferida, pois Yeda já dava o episódio como encerrado desde que recebeu um atestado de legalidade do negócio dado pelo Ministério Público e pelo Tribunal de Contas. Yeda sempre disse que a casa custou R$ 750 mil. Magda diz que o imóvel teria custado “cerca de R$ 1 milhão”. Se houver novos indícios, nada impede que o procedimento seja reaberto pelo MP.
Em outro trecho das fitas, Cavalcante afirma que despesas do comitê eleitoral teriam sido custeadas pela agência de publicidade DCS. A empresa teria pago suas passagens aéreas e diárias no flat Swan Molinos, em Porto Alegre. Após a eleição, a agência teria arcado com recepções oferecidas por Yeda em sua casa.
O vice-presidente da agência, Roberto Callage, disse sábado que a DCS tem uma relação profissional com o governo, garantida por licitação e contrato. O empresário afirmou desconhecer Cavalcante e negou ter pago qualquer despesa dele. Gabriela Swan, diretora da rede Swan, confirmou que o ex-assessor se hospedava no flat, mas disse não ter dados sobre o pagamento.
As gravações também se referem a outro episódio polêmico: uma carta de Lair à governadora, publicada por ZH em junho de 2008. No documento, Lair descrevia como os recursos eram desviados do Detran. Lair estava descontente com o comportamento dos outros integrantes do esquema. Quando o tema veio à tona, em meio à CPI do Detran, Cavalcante disse não ter encaminhado a denúncia para Yeda. No áudio obtido pela revista, porém, o ex-assessor conta ter dado a ela a carta.
Magda, segundo a revista, assegurou a autenticidade dos áudios. Ela disse ter ouvido as gravações e que o ex-companheiro reconhecia o conteúdo. O ex-assessor teria lhe relatado os mesmos fatos. A viúva teria demorado para confirmar o material por medo de perder o apoio para sua revista, a Sras&Srs, por parte de governos aliados de Yeda. Magda disse que Cavalcante soube em novembro dos áudios.
Em janeiro deste ano, o ex-assessor, segundo a viúva, teria aceitado confirmar o conteúdo das gravações aos procuradores federais que apuram o episódio, mas morreu antes da audiência. Magda viveu com Cavalcante por 15 meses, a partir do fim de 2007. Desde a morte, já deu declarações e depois tentou desmenti-las. A ZH, em reportagem de 19 de fevereiro, revelou que o ex-assessor tinha aceito depor ao Ministério Público Federal, mas andava nervoso. Depois da publicação, a viúva passou a afirmar que havia dado a entrevista sob forte emoção e que deveria ser desconsiderada. Cavalcante CAROLINA BAHIA, BD
O QUE DISSE YEDA NO SÁBADO |
“Carlos Crusius recebeu a todos, ouviu a todos. Ele jamais foi arrecadador de campanha.” |
“Essa (suspeita sobre a casa) seria a requentação da requentação da requentação. O MP, numa modelar investigação, provou a idoneidade da compra da casa. O MP tem a prova. Por que isso não repercute em meio à repercussão de uma denúncia sem prova?” |
“Não considero as declarações dessa moça. É uma versão que ela está criando para se livrar da hipótese de suicídio induzido, o que é muito grave. Ela disse ter ouvido de uma pessoa que não pode mais falar. Marcelo está morto.” |
“São amigos de décadas (Lair e Cavalcante). Como uma pessoa grava um amigo quando precisa pegar uma defesa em relação à Operação Rodin? A desqualificação dessas pessoas eu faço questão de fazer.” |
“Houve traições. A gente tem de dizer isso. É da vida, quem está dentro de casa sabe que é da vida, não apenas da política. A gente vai se decepcionando.” |
O QUE PODE ACONTECER |
1A reportagem da revista Veja, mesmo que baseada principalmente em cima da entrevista da viúva de Marcelo Cavalcante, reafirma denúncias que dirigentes do PSOL vinham fazendo desde fevereiro, como por exemplo, a contribuição de campanha que envolveria empresas fumageiras. O PSOL diz ainda ter tido acesso a vídeos, além de áudios, também gravados pelo lobista Lair Ferst. |
2A se confirmarem as revelações da empresária Magda Koenigkan, é muito provável que Lair tenha feito, de fato, acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal – acordo que vem sendo desmentido pelo próprio. As fitas, gravadas por Lair (e que Veja teria tido acesso), estariam em poder dos procuradores da República. |
3As novas denúncias reforçam a possibilidade de CPI na Assembleia. Até sexta-feira, a oposição tinha 14 das 19 assinaturas necessárias para a instalação da comissão para apurar denúncias que vieram à tona após a morte de Cavalcante. No sábado, o deputado Raul Pont (PT) já afirmou que o novo cenário “deve convencer mais deputados” a aderirem à proposta da oposição. |
4No entendimento de procuradores do Ministério Público, ouvidos por ZH, o arquivamento da investigação da compra da casa de Yeda foi “provisório”. Ou seja, pode ser reaberto com o surgimento do que eles qualificam de indícios mais consistentes. A forma de aprofundar o episódio exige a quebra de sigilo bancário da governadora, de seu ex-marido e da família do ex-secretário Delson Martini, que comprou o apartamento de Capão da Canoa do casal Crusius. Na época, o Judiciário entendeu que não havia elementos para pedir a quebra do sigilo. |
5 A própria governadora disse sábado, em entrevista coletiva, estar preparada para o surgimento do relato de mais fitas. “Todo mundo sabia que Lair fazia gravações”, disse Yeda. |