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01/07/2009 JORNAL DO COMÉRCIO
Congresso: Tributação é discutida na Serra
Contadores, advogados, procuradores, representantes das Receitas federal, estadual e municipais e profissionais de outras áreas estiveram reunidos entre os dias 25 e 28 de junho em Gramado discutindo temas polêmicos do meio tributário. A VIII edição do Congresso Direito Tributário em Questão, promovido pela Fundação Escola Superior de Direito Tributário (Fesdt ) abordou temas atuais como as controvérsias entre a Receita Federal, o contribuinte e o direito tributário na questão da cumulatividade do PIS/Cofins e o ressarcimento dos créditos fiscais, assunto ainda polêmico no Brasil.
Mais de 850 profissionais acompanharam os debates que contaram com a participação de especialistas nacionais no assunto. O presidente da Fesdt, Luiz Antônio Bins, destacou a complexidade do sistema tributário nacional. Segundo ele, desde a primeira edição do congresso, em 2002, os participantes do evento deparam-se com questões que necessitam de melhorias em termos de qualidade da tributação, simplificação das normas, busca de eficiência tanto por parte do Fisco quanto pelos contribuintes e redução de custas, entre outras. "São pontos que fazem parte de uma ampla discussão no País. A maior prova disso é a reforma tributária. Embora sempre em discussão, ainda não foram implementadas as modificações."
O assunto foi abordado também durante o painel Segurança Jurídica e direitos fundamentais em matéria tributária, apresentado pelo professor da Puc de São Paulo Paulo Barros Carvalho. Na primeira edição do congresso, lembrou ele, falava-se muito em reforma tributária. Havia um clima de euforia na época em torno da sua realização.
Carvalho diz que, naquela ocasião, já não acreditava em mudanças radicais. "Reformas bruscas eram feitas no tempo do regime militar, quando os generais estipulavam prazo para os projetos e não havia como escapar. Os tempos mudaram e hoje, para implantar as alterações, é preciso ouvir União, estados e municípios."
Os interesses, muitas vezes inconciliáveis, dificultam a realização das mudanças. Além dos entes federados, Carvalho defende que os representantes dos contribuintes sejam ouvidos. Ao comentar o projeto encaminhado pelo governo federal ao Senado, o especialista criticou o número de emendas, que somam 470, muitas substitutivas. "Essa quantidade de emendas dificulta a aprovação da reforma, deixando-as mais distantes do que quando foram propostas", lamentou.
Posicionamento do Fisco prejudica exportadores
O painel Tributação e Comércio Exterior: alternativas à recorrente problemática quanto ao aproveitamento ou ao ressarcimento dos créditos fiscais (PIS, Cofins e IPI) e estaduais (ICMS) foi um dos mais polêmicos. Apresentado pelo superintendente-adjunto regional da Receita Federal Marcelo Ramos Oliveira e pelo vice-presidente da Fesdt, Fábio Canazaro, as exposições proporcionaram à plateia duas opiniões distintas sobre o tema - de um lado o Fisco de outro a visão de quem lida com as dificuldades dos contribuintes em atender às exigências do governo.
A apresentação começou com a posição da Receita. Oliveira criticou algumas empresas, que desde setembro e outubro passado, quando começou a crise econômica mundial, têm pedido compensação de crédito do IPI como forma de solucionar seus problemas financeiros. Segundo ele, há vários processos na Receita nesse sentido que não são bem fundamentados. A solução, para ele, seria estipular multa aos que estejam recorrendo a essa medida para obter recursos.
A exposição do tributarista Canazaro trouxe ao debate críticas ao posicionamento do Fisco em relação aos créditos de IPI. "O uso dos créditos do IPI tem percorrido um caminho tormentoso ao longo dos anos." O Fisco, segundo ele, tem posições que nem sempre beneficiam os contribuintes. Canazaro explicou que existem direitos que concedem eficácia imediata, bem como compensação a esses créditos de exportações. Entretanto, há um embate entre Fisco e contribuintes sobre o tema não só no âmbito federal como também no estadual.
A interpretação da Receita Federal sobre o tema não tem se mostrado a ideal, conforme crítica de Canazaro. Há casos em que, após transcorrido longo período e processos administrativos de ressarcimento morosos, o exportador pode dispor os créditos a que teria direito. Entretanto, esses valores são devolvidos sem nenhuma correção monetária. "O Fisco devolve apenas uma parte do crédito e não sua integralidade. A ineficácia da justa indenização já é reconhecida pelos tribunais", destacou o tributarista.
Canazaro citou outras questões recentes de problemas de crédito junto à União que estão chegando ao Judiciário. Um deles é a compensação de ofício. Em função dos parcelamentos da União que as empresas exportadoras paticipam, a administração tributária não devolve as quantias a que esses contribuintes teriam direito. "O parcelamento não deve ser confundido com débito tributário em aberto." Quando o contribuinte recorre aos tribunais e tem ganho de causa, mais uma vez os valores são devolvidos sem correção. "É necessário simplificar", disse.
Com dois anos de implantação, Simples Nacional requer melhorias
A importância das micro e pequenas empresas e o tratamento tributário dado a elas foi abordada no painel Questões Controvertidas do Simples Nacional,. O gerente de Políticas Públicas do Sebrae Nacional Bruno Quick, lembrou que o setor, embora formado por pequenos negócios, representa um grande universo com papel importante para o desenvolvimento do País.
Quick citou alguns dados sobre o empreendedorismo no Brasil, lembrando ser esta uma forte característica nacional. Em torno de 12% da população adulta possui um empreendimento, o que coloca a Nação em décimo lugar no ranking de mais empreendedores do mundo. A falta de mercado para os jovens e a perda de postos de trabalho por parte das pessoas de mais idade são alguns dos fatores que geram o interesse em montar um negócio próprio, explicou.
Para atender às necessidades do setor que constitui em torno de 99% dos negócios nacional, uma vez que as ME e EPP somam cinco milhões de empresas formais e dez milhões de informais, o governo lançou mão nos últimos anos de projetos para auxiliar o segmento. O Simples Nacional é uma dessas iniciativas. Em vigor desde 1 de julho de 2007, proporcionou a unificação de 8 tributos e trouxe redução da burocracia, entre outras medidas.
Embora o Simples Nacional tenha trazido melhorias, Quick destacou fatores que ainda repercutem na sua eficácia, como a perda de benefícios anteriores do ICMS, dados nos antigos Simples e retomado em alguns estados e a cobrança de bitributação e eliminação dos efeitos do sistema. Também são prejudiciais a cobrança distorcida do diferencial de alíquota de crédito e eliminação dos efeitos do Simples e a não geração de crédito para empresas não optantes. "A perda chega a 22%, algo que tira qualquer empresa do mercado", explicou.
Neste ano, o Simples Nacional obteve 502,639 mil solicitações de adesões. Foram indeferidos mais de 239 mil pedidos. O motivo dos indeferimentos, segundo Quick, são os problemas enfrentados pelas empresas como débitos junto ao Fisco. O contribuinte que possui qualquer passivo tributário está impedido de optar por um regime diferenciado. Outro dado preocupante é a elevada taxa de mortalidade das micro e pequenas empresas, que em alguns anos superou o número de 50% dos negócios constituídos. A saída, afirmou Quick, é reforçar o tratamento diferenciado dado ao segmento com a incorporação de mecanismos legais e seguros para reverter esse quadro.
Contadores e advogados devem trabalhar em sintonia
Um dos pontos abordados durante o congresso foi o diálogo entre a contabilidade e o direito. Participaram do debate o vice-presidente Técnico do Conselho Regional de Contabilidade do Estado, o contador Antônio Carlos de Castro Palácios, o professor da Ufrgs e membro da Fesdt Igor Danilevicz e o professor da PUC/SP Roque Carrazza. Palácios, há 35 anos na área contábil, disse que o profissional da contabilidade necessita do suporte jurídico para suas atividades. De acordo com ele, o tema escolhido pela Fundação é de suma importância porque as duas áreas são vitais para as empresas e precisam estar em sintonia.
A partir de 1977, segundo Palácios, iniciou-se uma forte intervenção do Fisco nacional na contabilidade brasileira. "Desde então, o profissional da contabilidade nunca mais passou a atuar de forma plena", reclama. O vice-presidente do CRC-RS reconhece que a comunicação entre o direito tributário e a contabilidade se tornou ainda mais necessária.
O papel de cada área deve ficar bem claro. De acordo com Palácios, o contador detém as informações técnicas e, com esses dados, o advogado pode averiguar, conforme seus conhecimentos jurídicos, se a empresa está pagando correto, ajudando-a a pagar os impostos de maneira mais eficiente. "Antigamente quando um contador ia procurar um emprego, o empregador buscava saber seus conhecimentos jurídicos. De tempos pra cá o advogado tributarista assumiu este papel." Na opinião de Palácios, as duas áreas são importantes e valorizadas, porém, a contabilidade foi sucateada pela tributação.
Em 2007, o governo federal sancionou a Lei 11.638 acabando por divorciar a contabilidade societária da contabilidade fiscal. Para ele, a MP 449 não resolve o efeito honeroso das regras tributárias nas empresas. Palácios diz que a contabilidade, hoje, será realizada a partir das regras de mercado e, em função disso, gera-se cada vez mais a necessidade de diálogo entre advogado e contador. "O Fisco diz o que precisamos fazer, e os nossos balanços evidenciarão o que as empresas ganharam. Esta luta depende do relacionamento entre advogados e contador", resume.
Para Danilevicz o diálogo entre as duas profissões é possível e deve ser feito. "Nós juristas podemos cometer enganos", explica Danilevicz demonstrando a necessidade da comunicação entre as áreas.
O professor Roque Carraza, que também participou do painel, ressaltou que a integração é possível e necessária. Ele salientou a complexidade dos tributos no Brasil. Carraza tratou de demonstrar que nenhuma profissão é o centro de tudo e que o profissional do direito não pode ter "arrogância" em se julgar sabedor de tudo. "A contabilidade é uma ciência exata o que nos reporta à exatidão e à competência", define Carraza. Já o advogado, na visão de Carraza, consegue traduzir as regras, as leis, os regimes e deduz qual o melhor caminho a ser tomado pelas empresas, "daí a importância desta profissão".