18/01/2017 Folha de S. Paulo
O sistema de Previdência do Chile está em crise. Depois de ser copiado por diferentes países do mundo e angariar apoiadores até no Brasil, o regime que promete entregar ao trabalhador na velhice o que ele próprio economizar durante a vida profissional está sendo posto à prova.
A geração que viveu o pior momento do mercado de trabalho, entre a segunda metade dos anos 1970 e meados da dos 1980, está chegando à aposentadoria decepcionada.
"Minha sogra se aposentou com 150.000 pesos [R$ 717], e não dá para pagar as contas com isso", diz Boris Espinoza, 37, funcionário público da cidade de Illapel. O valor é bem inferior ao do salário mínimo chileno, de 264.000 pesos (R$ 1.260).
Segundo cálculos do economista Guillermo Larraín, um dos que contribuíram na última reforma da Previdência, em 2008, as pessoas que estão chegando à idade de se aposentar conseguem, no máximo, 63% do salário que recebiam na ativa. Muitos sofrem decréscimo de renda ainda maior e se aposentam com cerca de 40% do salário.
No sistema chileno, criado sob a ditadura de Augusto Pinochet, trabalhadores do setor privado e servidores públicos contribuem com 10% de seu salário para a Previdência. Informais podem fazer depósitos por conta própria.
A diferença em relação ao modelo brasileiro é que os recursos são depositados numa conta individual, que vai bancar a aposentadoria do dono. O benefício é resultado da poupança ao longo da vida.
A gestão dessas contas é feita por cinco empresas privadas que agregam os recursos em fundos de pensão. Juntos, eles movimentam o equivalente a 70% do PIB chileno.
"O problema é como se acumula essa poupança ao longo da vida, e isso tem relação com o mercado de trabalho", diz Larraín. "O sistema se baseia excessivamente na capacidade de acumular poupança das pessoas, que é muito débil quando há fragilidade no mercado de trabalho."
Espinoza se diz tão insatisfeito com o que espera receber na velhice quanto a jornalista Susana Mena, 55 anos, moradora de Santiago.
Susana entrou no mercado nos anos 1980 e afirma que a previsão é receber 500.000 pesos mensais (R$ 2.400) –menos que o aluguel de um apartamento como aquele em que vive (700.000 pesos). "Criamos uma sociedade extremamente individualista e chegamos a um ponto em que queremos rediscutir isso."
No ano passado, grandes manifestações contra o sistema de previdência ganharam as ruas. A presidente Michelle Bachelet, que já promoveu reformas em várias áreas no atual mandato, diz querer rever o sistema, que considera "inviável" para atender os atuais e futuros aposentados.
Espinoza apoia as manifestações, cuja principal bandeira é acabar com a gestão privada e mudar o sistema para um modelo parecido com o do Brasil: todos contribuem para um único caixa, estatal, que reparte os benefícios.
Ele diz que deverá receber uma aposentadoria de 400.000 pesos (R$ 1.930), um quarto do que consegue hoje com o salário mais a construção de casas em sua cidade.
"Estou preocupado por solidariedade. Estou fazendo minha poupança para a velhice, mas quem não tem emprego formal não consegue."