Artigo do auditor-fiscal da Receita Estadual Leonardo Maranhão Busatto, publicado na página 21 do Jornal Zero Hora do dia 08/06/2016.
Em meio ao momento político e econômico nacional singular, desponta uma questão federativa de máxima relevância para os Estados: a implantação das novas regras das dívidas com a União. A Lei Complementar 148 dispôs a redução dos juros de 6% para 4% ao ano e alteração do índice de correção de IGP-DI para IPCA, além da aplicação de desconto com base na apuração do saldo pela variação acumulada da Selic desde a assinatura dos contratos.
Tais alterações seriam aplicadas mediante aditamento contratual, até janeiro de 2016. Para nosso desapontamento, poucos dias antes do prazo, o desconto apresentado pelo agente da União foi nulo, já que o critério de apuração levaria ao aumento e não à diminuição da dívida. Isto levou o governo gaúcho, a exemplo de Santa Catarina, a entrar com mandado de segurança no STF para defender o cálculo do desconto pela Selic de forma acumulada, e não capitalizada, e também requerer abstenção da União de impor penalidades. Em abril, o Estado obteve liminar provisória, até a definição do mérito. Em sequência, diversos Estados obtiveram liminares semelhantes.
Desde a assinatura dos refinanciamentos com a União, no final dos anos 90, os Estados apresentaram notável ajuste e contribuíram para os superávits do setor público consolidado, concorrendo para a estabilidade que levou à elevação do país para "grau de investimento”. Isto passou a permitir a captação da dívida federal a juros mais reduzidos, benefício que não foi estendido aos Estados. No período, as dívidas dos Estados foram negativamente impactadas por um índice amplamente distorcivo. Enquanto o IPCA apresentou, de 1998 a 2012, variação de 151%, o IGP-DI foi de 248%, causando exorbitante distorção na correção dos saldos e prejudicando os Estados. Caso a dívida gaúcha fosse corrigida no período pelo IPCA ao invés do IGP-DI, o saldo devedor cairia de R$ 42,6 bilhões para R$ 22,6 bilhões. A simples substituição do indexador reduziria a dívida para quase a metade.
Nos últimos anos, o BNDES foi contemplado com aportes maciços do Tesouro Nacional para permitir o financiamento do setor produtivo com juros subsidiados. Enquanto aos tomadores do BNDES foram dados juros baseados na TJLP, sem nenhuma correção monetária, aos Estados nenhum alívio foi concedido. Um tratamento diferenciado e injusto. Por legislação federal, medidas com impacto para os Estados têm sido criadas, como desonerações fiscais e vinculações orçamentárias, sem contrapartida necessária de recursos. Tais medidas exercem pressão fiscal que a maioria dos Estados não tem conseguido equacionar.
Neste contexto, entendemos que a implantação das novas regras para a dívida, pelo critério que representa o sentido da Lei, significa não um benefício, mas a correção de um tratamento injusto retratado nos últimos tempos no seio federativo.