Que importava se era uma ditadura? Tanto fazia se todo o poder estava nas mãos de um monstro chamado Pinochet! Os liberais radicais brasileiros não se escondiam mais para elogiar o modelo econômico chileno.
Era a menina dos olhos dos defensores do Estado mínimo – salvo, no caso, para tortura e repressão – e de uma forma “moderna” de gerir os interesses da sociedade. A educação superior, a saúde e as aposentadorias foram privatizadas. A educação superior chilena excludente levou jovens às ruas nos últimos anos e a uma reforma incompleta e tida por decepcionante. Agora é a vez de aparecerem os buracos da privatização da Previdência.
A Folha de S.Paulo, pelo jeito, queria elogiar o famoso modelo do país vizinho para defender o odioso projeto do governo Temer: “No Chile, as aposentadorias asseguram 37,7% da renda da ativa. No México, apenas 28,4%. Nos EUA, 44,8%”. No Brasil, seriam mais de 80%. Para a maioria, 80% de quê? De muito pouco. Que tal se aposentar com 37,7% de um salário mínimo? Ou, mexicanizando o modelo, com 28,4%? A mídia deu com os burros n’água: “Segundo cálculos do economista Guillermo Larraín, um dos que contribuíram na última reforma da Previdência, em 2008, as pessoas que estão chegando à idade de se aposentar conseguem, no máximo, 63% do salário que recebiam na ativa. Muitos sofrem decréscimo de renda ainda maior e se aposentam com cerca de 40% do salário”. O que isso significa? Miséria. Podem ser 40% de um salário mínimo equivalente a R$ 1.260.
A palavra é forte? Não. Ele é tão exata quanto o resultado de uma operação matemática feita com maestria. Detalhe do modelo chileno. Cada trabalhador tem uma conta de aposentadoria: “A gestão dessas contas é feita por cinco empresas privadas que agregam os recursos em fundos de pensão. Juntos, eles movimentam o equivalente a 70% do PIB chileno”. Ganham muito dinheiro. Os seus executivos faturam bônus milionários. Vivem no paraíso. O Chile terá de rever seu modelo ou jogará no desespero milhões de pessoas. Há quem não consiga pagar o aluguel do apartamento com o valor da aposentadoria. A ideia, considerada perfeita, é simples: a cada um na aposentadoria conforme a sua poupança na vida ativa. A mídia está fazendo a sua parte do trabalho sujo para ajudar Temer a emplacar seu projeto previdenciário.
A Rede Globo multiplica as reportagens sobre o quanto é bom trabalhar depois dos 70 e até dos 80. Mantém a cabeça limpa, ajuda na circulação, facilita a interação social, serve de entretenimento, atrasa a morte e ajuda o país. Chega a ser comovente. São exemplos edificantes. A exceção toma o lugar da norma. As doenças não incomodam. Desaparece o fato de que a expectativa de vida de parte da população brasileira não passa de 66 anos de idade. Jovens ainda não chegam às universidades chilenas por falta de recursos. Que importa? Os alunos alcançam ótimos resultados nos rankings internacionais. A universidade deve ser mesmo para formar elites. Os demais que se dirijam a escolas técnicas. Os brasileiros querem boas aposentadorias? Que poupem! Que parte a maioria deve colocar de lado dos seus salários? Que tal a da comida? A população brasileira está cada vez mais obesa. Não é?