O Ministério da Economia erra mais uma vez ao trazer uma proposta de reforma tributária que, além de não corrigir as piores anomalias da forma como se cobram impostos do Brasil, ainda as agrava. Caso se confirme a intenção do governo de diminuir a alíquota teto do imposto de renda de pessoa física (IRPF) de 27,5% para 25%, a medida irá aumentar a já abismal desigualdade existente no País, pois beneficia diretamente as altas rendas, que hoje já pagam uma alíquota efetiva muito menor do que as bases mais baixas da pirâmide social.
No Brasil, quem ganha menos paga mais impostos e quem ganha mais paga menos. Isso é injusto e inadequado
Isso acontece porque o Brasil cobra muito mais impostos sobre o consumo e serviço do que na renda e no patrimônio, principalmente dos mais ricos. Hoje, cerca de 50% da carga tributária dos impostos é sobre o consumo. Essa característica trava o crescimento econômico e claramente aumenta a desigualdade. Para se ter uma ideia da distorção do nosso sistema, nas faixas de renda superiores a 320 salários mínimos mensais, a base de cálculo para imposto representa apenas 7,7% da renda total declarada; já para quem ganha entre um e cinco salários mínimos, corresponde a mais de 60%.
Outra razão desse problema é a isenção da taxação sobre lucros e dividendos – um imposto que é unanimidade mundial. Entre os países da OCDE, apenas a Estônia não o cobra. Uma mudança crucial para deixar nosso sistema mais justo e que não consta, ao que tudo indica, na proposta do Governo Federal. Aliás, que não consta em nenhuma das propostas que estão sendo discutidas no Congresso.
Estudos econômicos mais recentes, sejam de autores brasileiros – como escritos pelos exemplares economistas do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) – ou do exterior – como os do economista francês Thomas Piketty – mostram que mudanças no sistema tributário podem auxiliar na redução da desigualdade tanto ou mais do que políticas de transferência de renda ou mudanças substanciais no sistema educacional. Então, como um dos países mais desiguais do mundo, não podemos abrir mão dessa ferramenta.
Há de se reconhecer a importância do ímpeto reformista do Governo Federal e do Congresso Nacional no que tange ao sistema tributário brasileiro. Contudo, é extremamente preocupante que nenhuma das propostas em discussão atualmente ajude a corrigir o grande problema da regressividade do sistema.
Uma questão que vai contra o princípio da capacidade contributiva, presente na Constituição. Muitas das anomalias citadas poderiam ser alteradas facilmente em projetos de lei, que trariam ganhos extremamente positivos para a economia de forma geral, com resultados positivos em curto, médio e longo prazo.
Existem propostas no âmbito da sociedade civil que não podem mais ser ignoradas no debate público. Refiro-me à Reforma Tributária Solidária, única, aliás, a enfrentar o problema crucial e até então tratado como tabu pelas demais propostas de reforma tributária em tramitação no Congresso Nacional: a regressividade do sistema tributário.
Por mais que se alegue a complexidade da pauta tributária, o problema central da regressividade é de simples entendimento: no Brasil, quem ganha menos paga mais impostos e quem ganha mais paga menos. Isso é injusto e inadequado, independente da preferência política de cada um.
A ideia de que uma menor tributação dos mais ricos pode gerar riquezas e emprego tem se mostrado equivocada, pois não trouxe ao Brasil um diferencial competitivo que supere o alto custo dos produtos e o baixo consumo causado, principalmente, pela baixa renda da maioria dos brasileiros. Uma política tributária que não encare essa realidade de frente não pode ser chamada de “reforma”, e sim mais um remédio paliativo que alivia em parte o sintoma, mas não traz a cura para um sistema extremamente doente e defasado.