Ninguém se reinventa. E ninguém é chamado para dirigir a 8ª economia do mundo sem ser apoiado por um conjunto de interesses. Neste país onde se cobra ao mês juros que no resto do mundo se cobra ao ano, e se afundou em dívidas 64 milhões de adultos, mas também as pequenas e médias empresas, e até o Estado com a dívida pública, vale a pena lembrar de quem se trata.
O Economist de 13 de dezembro de 2018, na reportagem “Jair Bolsonaro must tackle Brazil´s soaring pensions spending” apresenta o nosso novo ministro da Economia: “Paulo Guedes, who studied at the University of Chicago and co-founded BTG Pactual, Brazil’s foremost home-grown investment bank” [Paulo Guedes, que estudou na Universidade de Chicago e co-fundou o BTG Pactual, o principal banco de investimentos do Brasil]. Portanto, universidade de Chicago, onde se formaram os chamados “Chicago boys” que apoiaram ditaduras e desastres sociais por onde passaram. E no Brasil, co-fundador do Banco BTG Pactual.
Vale a pena dar uma olhada no que é esse banco. O relatório anual do Valor Econômico de 2015 apresenta o conjunto de empresas controladas pelo grupo BTG Pactual. Setores de atividade: bancos comerciais e múltiplos, corretoras e distribuidoras de valores. Principal executivo: André Santos Esteves. Co-fundador: Paulo Guedes.
Investment bank parece respeitável, mas em inglês não existe o conceito de aplicação financeira, qualquer atividade especulativa é apresentada como investment. O Economist por vezes distingue productive investment e speculative investment. O que o Pactual faz mesmo é wealth management, ou seja, gestão de fortunas, trabalhando com o que se chama internacionalmente High Net Wealth Individuals, ajudando os muito ricos a ganhar mais dinheiro com dinheiro. E assegura também a intermediação financeira para empresas que buscam “otimizar” os seus fluxos financeiros, na linha do asset management. No conjunto, trata-se de otimizar os ganhos financeiros dos mais ricos. Não se trata, evidentemente, de desenvolver atividades produtivas, pelo contrário, trata-se de drená-las.
O mecanismo aparece de forma muito clara ao constatarmos a dimensão e importância da “ponte” que foi montada entre os grupos no Brasil e os paraísos fiscais. Elencamos aqui as empresas do BTG Pactual sediadas em paraísos fiscais. A quase totalidade com controle 100%. Não é ilegal ter filiais em paraísos fiscais, mas serve essencialmente para especulação, evasão fiscal, lavagem de dinheiro e acobertamento de corrupção, tanto de empresas como de pessoas físicas. Ter quase 40 filiais em paraísos fiscais deixa claro o perfil de atividades do banco. Não é o único, naturalmente, e o BTG Pactual inclusive aprendeu com a UBS (Union des Banques Suisses).
Em 2015, o “Valor Grandes Grupos” publicou um organograma do BTG Pactual, nas páginas 128 a 131, que nos permite acompanhar a lista das filiais do banco. Ele pode ser acessado aqui ou nas imagens abaixo.
Ao observarmos o organograma acima, chegamos na lista das filiais do BTG localizadas em paraísos fiscais:
É útil lembrar que segundo o Tax Justice Network de Londres, em 2012, o Brasil tinha 519,5 bilhões de dólares em paraísos fiscais, equivalentes a cerca de dois trilhões de reais, um estoque que representa, como ponto de referência, quase um terço do PIB do país. É dinheiro que não só não é reinvestido no país, como não paga impostos, e desarticula as políticas econômicas legais.
O site do banco apresenta, como todos, os seus elevados princípios éticos, integridade etc., e os lucros correspondem à altura. Na realidade, se trata evidentemente de drenos sobre a economia produtiva, e a densidade da rede de paraísos fiscais sob seu controle mostra bem o destino. (Para ver como funciona, veja o meu capítulo sobre paraísos fiscais no A Era do Capital Improdutivo, capítulo 6, com um vídeo de 12 minutos).
O nosso super-ministro tem essas raízes, e navega na solidariedade com os interesses financeiros. Passar a Previdência para o controle dos bancos privados, desvincular as receitas do Estado para que possam se apropriar do financiamento da educação, saúde e outras políticas sociais, buscar a apropriação da gestão do FGTS – tudo em nome de reduzir o déficit do Estado, aumentando o rombo que precisamente os bancos geram, é bastante coerente.
Mas não corresponde às necessidades nem da massa da população que precisa de mais renda e crédito barato, nem das empresas que precisam da demanda dessas famílias para ter para quem vender e de crédito barato para poder investir. O déficit público? Se reduz justamente dinamizando a demanda das famílias e as atividades empresariais, que por sua vez geram mais receitas para o Estado. Há quatro anos estamos parados. O sistema financeiro tem de voltar a financiar a economia, não os rentistas.