Senhoras e senhores parlamentares, tendo em vista a gravidade da crise que estamos enfrentando neste momento, dirijo-me, respeitosamente, a vossas excelências, para pedir o seu empenho na promoção da tramitação no Congresso Nacional, com a urgência que o momento requer, dos projetos que visam a TRIBUTAR OS SUPER-RICOS. Não é demais lembrar que o juramento de posse de seus mandatos "Prometo manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro e sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil", constitui, sem dúvida, um farol que precisa ser observado, especialmente neste momento tão grave da nossa história.
Diversos organismos internacionais são taxativos ao afirmar que esta crise só tem paralelo nas crises econômicas do início do século XX e do pós guerra. No Brasil, os efeitos negativos foram particularmente potencializados pelo fato de a covid-19 ter chegado por aqui exatamente no meio de um processo de aceleração de redução sistemática do Estado. Em 2019, o SUS havia perdido mais de R$ 20 bilhões em recursos. O congelamento dos gastos primários, promovido pela EC95/2016, juntamente com uma série de outras medidas nos desarmou frente ao ataque desse inimigo inusitado e imprevisível.
A precarização das relações de emprego produzida pela reforma trabalhista e o corte sistemático dos gastos públicos não alavancaram a economia, como haviam prometido, pelo contrário, a crise só aumentou, o desemprego cresceu e cresceu também a população vivendo abaixo da linha da pobreza e da extrema pobreza.
A pandemia, portanto, não poderia ter acontecido em pior momento. Com o desemprego em alta, atividade econômica estagnada e com os cortes sistemáticos nos investimentos públicos, estávamos sem munição para enfrentar esta gravíssima ameaça. Isso explica, em parte, porque o Brasil é o 4º país do mundo com maior número de mortes per capita por covid, atrás do Peru, Bélgica e Bolívia. Em quantidade absoluta, só perdemos para os EUA.
Felizmente, prezados e prezadas parlamentares, ainda tínhamos, embora debilitadas, nossas estruturas de proteção social funcionando. A tragédia só não é maior, graças ao SUS e aos seus abnegados servidores. Até mesmo ministros de Estado, que entraram no governo com projetos de privatização do SUS, dele saíram reconhecendo a importância da sua manutenção e fortalecimento.
A economia, que vinha cambaleando antes da chegada da pandemia, agora agoniza pela redução do consumo. Os setores de serviços, de comércio e a própria indústria estão sofrendo os efeitos da queda da atividade econômica. Por outro lado, é preciso também perceber que há setores da sociedade que não perdem nunca. Aliás, há setores que enriquecem apesar da crise, ou por causa dela. Os 42 bilionários brasileiros tiveram aumento em suas riquezas em mais de R$ 170 bilhões durante os primeiros cinco meses da pandemia, valor superior a todo o orçamento da Saúde para 2020. O setor financeiro continua crescendo de forma extraordinária. Os cinco maiores bancos tiveram um lucro de R$ 53,4 bilhões nos nove primeiros meses do ano, mesmo tendo aumentado significativamente suas provisões para risco de créditos de provisão de liquidação duvidosa.
Importante lembrar, senhoras e senhores, que as classes mais ricas da sociedade brasileira têm sido historicamente subtributadas. Os mais ricos pagam menos tributos do que os mais pobres, proporcionalmente a suas rendas. A maior parte dos rendimentos dos mais ricos é isenta de Imposto de Renda, desde 1995[i]. Quem ganha mais de R$ 300 mil por mês tem quase 90% da renda isenta de tributação[ii]. Isso, somado ao fato de que até hoje, passados mais de 32 anos da promulgação da Constituição Federal, de 1988, ainda não tenhamos regulamentado o Imposto sobre Grandes Fortunas, faz do Brasil um dos países com maior concentração de renda e riquezas do planeta. Segundo a ONU, em 2019, éramos o segundo país do mundo com maior concentração de renda, atrás apenas do Catar.
Não há dúvidas, senhoras e senhores parlamentares, de que a saída para a crise passa pelo fortalecimento das estruturas do Estado, pelo aumento dos gastos públicos, pela garantia de renda para as famílias mais pobres e pelo apoio às micro e pequenas empresas. Está na hora, portanto, prezados parlamentares, de TRIBUTAR OS SUPER-RICOS para financiar o enfrentamento da crise, salvar vidas, retomar a atividade econômica e recuperar os empregos.
Precisamos corrigir as distorções da legislação do Imposto de Renda, revogando a isenção para lucros e dividendos distribuídos, eliminando a figura dos juros sobre o capital próprio, e implantando uma nova tabela de alíquotas. Com essas medidas, será possível reduzir impostos para quem ganha até 15 salários-mínimos mensais, em cerca de R$ 16 bilhões, e elevar a arrecadação sobre altas rendas em quase R$ 160 bilhões.
Com a implementação do Imposto Sobre Grandes Fortunas, é possível arrecadar mais R$ 40 bilhões, incidindo apenas sobre as parcelas de riquezas superiores a R$ 10 milhões de patrimônio. Com apenas duas medidas, que afetem um conjunto muito reduzido da população, menos de 0,3%, será possível prover um volume importante de recursos para o enfrentamento da crise, além de reduzir tributos para os trabalhadores com rendas mais baixas e para as pequenas empresas, reduzindo as alíquotas do Simples Nacional.
Além dessas medidas, as mais de 70 entidades que estão promovendo a campanha “TRIBUTAR OS SUPER-RICOS”, apresentam ainda outras duas propostas voltadas ao fortalecimento do orçamento da Seguridade Social, que consistem na elevação da alíquota da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) para o setor financeiro e para o setor extrativo mineral e a criação da Contribuição Social sobre Altas Rendas das pessoas físicas (CSAR), que incidirá apenas sobre as parcelas de rendas que ultrapassarem a R$ 720 mil por ano. Com estas duas propostas, será possível ampliar o orçamento da Seguridade em quase R$ 100 bilhões.
Uma terceira proposta atende as justas e legítimas preocupações dos governadores e prefeitos, pois oferece uma nova regra de repartição do Imposto de Renda e do IGF com Estados e Municípios. Sem prejuízo dos fundos FPM e FPE[iii], propõe-se que 10% da arrecadação do IR e 20% do IGF sejam repartidos com os entes subnacionais, promovendo um aumento de receitas de R$ 83 bilhões para os Estados, e de R$ 54 bilhões para os Municípios.
Por fim, senhoras e senhores parlamentares, este é um daqueles raros momentos da nossa história em que o futuro da Nação está colocado em suas mãos. Enfrentar a crise neste momento é uma necessidade, mas mais importante é decidir como enfrentá-la, pois a forma como vamos sair desta crise determinará o tipo de sociedade que teremos. Vossas Excelências poderão decidir pela retomada da construção do Estado de Bem-estar, que foi projetado pelos nossos constituintes em 1988, garantindo o cumprimento dos objetivos fundamentais da República, previstos no Artigo 3º da CF/1988, dentre os quais, ressalto, os de promover o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, ou pelo aprofundamento das reformas que desmontam o Estado e suas estruturas de proteção social, que relativizam os direitos sociais e que privatizam as políticas públicas. Em suas mãos, caros representantes da vontade geral, estão colocadas as duas opções - a escolha de uma afasta a outra, e não há dúvida de que somente uma delas é que interessa ao povo brasileiro.