Acompanhamos semana passada dois casos de presidentes inaptos, sem condição de comandar suas respectivas nações. O estadunidense Donald Trump, que nega sua derrota e incita movimentos autoritários para permanecer no poder, e Jair Bolsonaro, que confessou aquilo que até o mundo mineral já sabia: não consegue fazer nada pelo povo.
O povo norte-americano já decidiu trocar de presidente. Do lado de cá, a renúncia de Bolsonaro seria a saída menos traumática e até mesmo digna para alguém que se reconhece incapaz de dar conta das tarefas para as quais foi eleito.
As medidas fazem parte de um documento mais amplo intitulado “Tributar os super-ricos para reconstruir o país”, apresentado por um conjunto de entidades, entre as quais a Fenafisco, sob a coordenação do professor Eduardo Fagnani (Unicamp). O documento, lançado em meados de 2020, inspirou-se nos estudos da Reforma Tributária Solidária (RTS), com as devidas adequações ao contexto da pandemia.
As medidas aqui ressaltadas injetam progressividade no sistema tributário brasileiro, que hoje sobrecarrega os mais pobres e favorece o topo da pirâmide brasileira detentora das grandes fortunas.
A primeira medida, senhor presidente, é a revogação imediata da isenção do IRPF sobre os lucros e dividendos distribuídos aos sócios e acionistas das empresas.
A segunda medida, senhor presidente, ainda no âmbito do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, é a reformulação da tabela de alíquotas. Na parte de baixo, com a isenção da renda mensal de até três salários mínimos; na parte de cima, com a criação de novas alíquotas de modo a incrementar a carga efetiva do imposto sobre as rendas superiores a cerca de 35 salários mínimos.
As duas primeiras medidas, senhor presidente, têm potencial de incremento da arrecadação do IRPF na ordem de R$ 158 bilhões anuais.
A terceira medida, senhor presidente, é a instituição do Imposto sobre Grande Fortunas (IGF), previsto na Constituição Federal, que tem potencial de arrecadação de R$ 40 bilhões ao ano. No documento de tributação dos super-ricos, propomos que o IGF incida sobre as fortunas superiores a R$ 10 milhões, com alíquotas progressivas de 0,5%, para fortunas acima de 10 e até 40 milhões; de 1%, para fortunas acima de 40 e até 80 milhões; e de 1,5%, para fortunas acima de 80 milhões.
Presidente, o senhor sabia que apenas os 0,3% mais ricos do país têm uma fortuna desse tamanho?
O senhor haverá de concordar que, com essas alíquotas do IGF, nenhum super-rico brasileiro fica menos super-rico, não é mesmo? Mas lhe asseguro que milhões de super-pobres deixam a super-pobreza.
A quarta medida, senhor presidente, que na verdade tem que ser a primeira, é a revogação do teto de gastos, que em menos de cinco anos de vigência revela o quão infelizes são os seus efeitos num país que carece do poder público para combater a desigualdade e dar à população acesso a serviços básicos.
A quinta medida, senhor presidente, que na verdade é para já, é a manutenção do auxílio emergencial, que certamente salvou dezenas de milhares de vidas e alimentou dezenas de milhões de brasileiras e brasileiros país adentro.
Senhor presidente, é admissível que 42 bilionários brasileiros tenham aumentado suas fortunas em quase R$ 200 bilhões durante a pandemia, enquanto assistimos ao aumento da fome no país?
A renda básica aos mais pobres e desalentados é possível, mas precisa de pulso das autoridades para que os super-ricos, que são historicamente favorecidos e pagam proporcionalmente menos impostos, sejam tributados de maneira justa.
Senhor presidente, é direito que lhe assiste optar pela não-renúncia, mesmo diante da confissão pública de incapacidade. Por outro lado, não lhe assiste o direito à omissão diante dessa crise, tampouco lhe é facultado o direito de alegar que não pode fazer nada, quando sabemos e demonstramos, em poucas linhas, que é larga e ampla a margem das coisas que podem e devem ser feitas neste e por este país tão desigual e injusto.
O que falta, senhor presidente, para que os super-ricos sejam chamados a pagar essa conta? Falta coragem?
Se é isso, ainda lhe resta a renúncia.