Apesar das sucessivas alterações de texto, a PEC 32/2020 não consegue esconder a permanência de duas ideias-força: transferência de serviços públicos para agentes privados e a ampliação do controle da classe política sobre a burocracia.
Para além de uma mudança na burocracia estatal, a reforma administrativa representa um projeto de País. Justamente o mesmo projeto que subordina a sociedade ao interesse de acionistas em mercados oligopolistas.
Permanecem intactos no projeto os acordos de compartilhamento de recursos humanos e materiais com setor privado para a entrega de serviços públicos. Na prática, a tendência é a eliminação de concurso público para áreas como educação e saúde, onde oligopólios privados há muito cobiçam esse mercado. Ainda que a crença profunda de um setor privado virtuoso e um público danoso influencie no debate público, o resultado será o aumento do custo de vida. Em um primeiro momento o mercado se apresenta eficiente, em seguida, concentra em oligopólios e, logo, precariza ou encarece desproporcionalmente o serviço prestado. Sobram exemplos entre as grandes potências capitalistas que o melhor caminho é a provisão pública de educação e saúde.
Um setor público muito mais suscetível às influências políticas, do patrimonialismo e de lógicas venais aparecem na reforma. A massa da burocracia de rua contratada por processo simplificado, tempo determinado, sem concurso público e estabilidade será mais facilmente cooptável. A perda do cargo por declaração de obsolescência através de ato próprio do chefe do poder executivo concentrará poderes. A ausência de quarentena para ocupantes de cargos tidos como exclusivos de Estado aumentará a porta giratória para o setor privado, ainda mais em um mercado aquecido pelo compartilhamento de atividades.
O custo da transição da PEC 32 será sentido por todos nós. Em especial pelos déficits previdenciários que serão ampliados, pelo subfinanciamento dos Regimes Próprios de Previdência Social. Fecham-se postos de trabalho no setor público, delegam-se atividades para o setor privado logo, caem as receitas previdenciárias. Ainda que se sobretaxe os remanescentes, não será suficiente: a sociedade é quem pagará. Algo similar ao custo de transição que inviabilizou a capitalização integral da previdência. Novamente, não se evidenciam os impactos econômicos da transição.
Presidente da União Gaúcha em Defesa da Previdência Social e Pública, Presidente do Ceape-Sindicato.
Publicado Originalmente: O Brasil que está na Reforma Administrativa