Artigo publicado no Jornal do Comércio
Dentre as inúmeras discussões que foram travadas durante a apreciação legislativa do projeto que deu origem à Lei Complementar nº 13.452, de 26/04/10, a Lei Orgânica da Administração Tributária, chama a atenção a do Processo Administrativo-Disciplinar (PAD), previsto como encargo exclusivo da Receita Estadual – art. 3º, IV -, a ser exercido por seus titulares, os Agentes Fiscais do Tesouro do Estado.
Poderia parecer, em uma leitura menos aprofundada, que essa seria uma competência da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), prevista no art. 115, IV, da Constituição Farroupilha e, com igual teor, no art. 2º, XIV, da Lei Orgânica da Advocacia de Estado – Lei Complementar 11.742/02. Entretanto, em um exame mais minucioso da matéria, verifica-se que o texto constitucional determina que cabe a PGE “realizar processo administrativos disciplinares previstos em lei”, assim como a própria lei complementar 11.742/07 ao ressalvar que cabe a participação da PGE “nos casos previstos em lei”, e genericamente “no âmbito da administração pública estadual”. Portanto, é lícito, desde que disposto em lei, atribuir a responsabilidade do PAD a outro órgão do Estado.
A tese da atribuição do PAD a outros órgãos encontra albergue nos regramentos específicos da Brigada Militar, previsto no art. 45 da Lei Complementar nº 10.990/97, e da Polícia Civil, previsto no art. 16, III, da Lei nº 10.994/97.
Trata-se de mais um equívoco. O texto constitucional, o art. 115, IV, conduz a entendimento diametralmente oposto aquele defendido pelos que creem haver a “possibilidade de nulidade”. Na sua parte final, o inciso IV estabelece que a PGE deve emitir “pareceres nos que forem encaminhados à decisão final da governadora”. A própria Carta Magna Gaúcha distingue e excetua hipótese em que a manifestação final do PAD deva ser externa aos agentes e à instituição aos quais a Lei atribua a responsabilidade de sua execução.
E nem poderia ser diferente, pois é por demais evidente que penas capitais de um processo administrativo disciplinar, como o da demissão, sejam de responsabilidade da autoridade máxima do Estado, sem que daí possa decorrer qualquer espécie de nulidade.
Assim, é extremamente simples concluir que se na Lei há um dispositivo genérico que prevê a exclusividade do PAD a determinados agentes e, nesta mesma Lei, há outra regra especial que visa garantir a competência exclusiva ao Governador para aplicação de penas capitais decorrentes desse PAD, não se pode supor que ocorra qualquer espécie de nulidade quando o chefe do executivo estadual for a autoridade a aplicá-la.
O que nos ensina a leitura sistêmica e conexa do disposto na Constituição Estadual e na Lei Orgânica da Advocacia de Estado, é de que tais dispositivos foram criados para assegurar que todo o PAD realizado no âmbito da administração pública estadual venha a ser realizado ao abrigo do devido processo legal, seja ele executado por órgãos e agentes específicos quando disposto em lei especial, seja pela Procuradoria-Geral do Estado quando não houver tal previsão.
JOÃO ANTÔNIO ALMEIDA MARINS
PRESIDENTE