Impostos e gatos
Em tempos medievais, os gatos (felinos) eram amaldiçoados e perseguidos, até bula papal os condenava. Eles seriam os responsáveis pela peste negra, pois surgiam onde havia ratos, os furtivos transmissores do mal. Algo parecido ocorre hoje, a enorme carga tributária aparece, exatamente, onde o Estado sofre de obesidade mórbida, onde há corrupção e desperdício desenfreados. Logicamente, ela não combate esses vilões e, até, os financia, além disso, há a velha discussão do ovo e da galinha: quem surgiu primeiro, o imposto ou o gasto. Porém, no caso, os (des)governantes, para satisfazer suas ambições, buscam recursos em todas as fontes, possíveis e impossíveis, e o imposto é apenas uma delas. Além de nos dar a real e dolorida dimensão da tragédia do Estado brasileiro, seguramente, é a alternativa menos perversa para financiar a gastança governamental. Muito mais deletérias, a inflação (conluio entre governos e classes abastadas para saquearem o bolso dos mais pobres que assim pagam a conta em maior proporção que a regressividade dos impostos), os empréstimos (transferência da conta para as futuras gerações acrescida de pesados juros) e o corte de recursos na educação, saúde, segurança, infraestrutura. Assim, em meio a esses protestos, os ratos avançam sem resistências: cargos, ministérios, secretarias, estatais, escritórios, agências são criados em confusa profusão, muitas vezes, com aplausos de setores empresariais. Não raro, os mesmos que reclamam da elevada carga tributária fazem gordas contribuições a políticos que professam e praticam o aprofundamento da presença estatal. Até governantes e legisladores, criadores, sancionadores e usufrutuários do Estado monstrengo, em arroubos demagógicos, anatematizam os elevados impostos. Em resumo, a execração da carga tributária é a caça medieval aos gatos. Falta apenas a bula e os autos-de-fé.
Antonio Augusto d´Avila, economista.