O Estado discute com a União os termos da adesão ao regime de recuperação fiscal. Faz isso em segredo. Não se conhece o que está sendo pactuado.
Não se trata de recuperação fiscal, mas de ampliar a submissão do RS à política econômica da União, fragilizando o pacto federativo.
O objetivo central do regime de recuperação fiscal, que traz um conjunto pesado de restrições e diminui significativamente nossa capacidade de gestar políticas públicas de desenvolvimento econômico e social em prol do povo gaúcho, é manter o Estado refém da lógica da dívida.
A dívida vigorava originalmente por 30 anos e passou a vigorar por 50. Transformou-se numa dívida eterna, a ser quitada até 2048. Foi contraída em 1998, pelo montante de R$ 9,5 bilhões, dos quais já pagamos R$ 37,1 bilhões e ainda devíamos R$ 73,7 bilhões ao final de 2021. Essa dívida já foi paga!
Essa é a tese defendida em ação patrocinada pelo próprio Estado do RS no STF. Nessa ação, o governo protocolou, no dia 25 de fevereiro de 2022, um pedido de desistência. Corre-se o risco de ficarmos sem a ação e sem o regime, caso este não seja homologado pelo presidente da República, a exemplo do que aconteceu recentemente com o Estado do Rio de Janeiro.
A mesma tese de que a dívida já está paga integra ação patrocinada pela OAB-RS, na qual a ministra relatora determinou que a União e o Estado se manifestem sobre as consequências processuais da renegociação na demanda do processo em questão.
São processos distintos sobre o mesmo tema, mas as exigências de desistência da ação alcançam apenas o Estado, não a OAB-RS.
E mesmo o RS, diante de situação quase idêntica, ainda durante o governo anterior, por razão de renegociação efetuada com fundamento na Lei Complementar Federal nº 156/2016, que exigia semelhante desistência, buscou e obteve liminar no Supremo para assinar a renegociação sem desistir da ação. Por qual razão o atual governo não tomou a mesma iniciativa?
Não é razoável submeter a sociedade à lógica de uma dívida eterna sem que haja um debate aprofundado com todos os atores da cidadania. Exatamente por isso, entendemos que deve ser imediatamente retirada a urgência na votação, prevista para o dia 3 de maio, do Projeto de Lei Complementar nº 48/2022 em tramitação na Assembleia Legislativa, a fim de que haja um grande debate sobre um tema que muito impactará o povo gaúcho pelos próximos anos.
Publicado originalmente no jornal Zero Hora. Leia mais (O acesso à matéria pode exigir assinatura pessoal.)