25/11/2009 FOLHA DE SÃO PAULO
Transferência para o Tesouro de R$ 5 bi em depósitos judiciais deve dar ao governo maior saldo primário desde abril
Graças a um artifício legal que elevou momentaneamente a arrecadação de impostos, o governo federal voltou a conseguir uma sobra expressiva de recursos para o abatimento de suas dívidas -insuficiente, no entanto, para o cumprimento das metas fixadas para o ano. Levantamento feito pela Folha a partir de dados preliminares aponta que, em outubro, a diferença entre as receitas da União e a soma das despesas com pessoal, custeio administrativo, programas sociais e investimentos, conhecida como superavit primário, foi semelhante aos R$ 10 bilhões de abril, melhor resultado já divulgado oficialmente em 2009.
Entre maio e setembro, as contas da União acumularam deficit de R$ 3,2 bilhões devido aos efeitos da crise econômica, o que provocou a descrença de analistas e investidores quanto às condições para a retomada das metas fiscais seguidas desde o início do governo Lula. Apesar de sinalizarem uma melhora, os números do mês passado deixam evidente que o superavit prometido para este ano não será atingido -e, o que é mais relevante, ainda estão longe do necessário para o estabelecido no Orçamento do ano eleitoral de 2010.
O Executivo manteve as despesas em expansão, com alta na casa de 10% acima da inflação, puxada, principalmente, pelos reajustes concedidos ao salário mínimo e ao funcionalismo do Executivo. As obras de infraestrutura, anunciadas como prioridade do segundo mandato de Lula, têm taxas de crescimento mais altas, mas continuam representando uma parcela pequena dos gastos. Os investimentos -que, além das obras, incluem a compra de máquinas e equipamentos- somaram R$ 3,4 bilhões em outubro, enquanto pessoal e Previdência, juntos, consumiram quase R$ 30 bilhões, ou quase dois terços do total. Como não há nem haverá disposição política para conter a escalada das despesas, a reedição dos superavit conseguidos até o final de 2008 depende de recuperação igualmente vigorosa das receitas, ainda não visível: a elevação de outubro, a primeira após 11 meses, não chegou a 1% acima da inflação. E esse aumento só foi possível devido à transferência para o Tesouro, via medida provisória, de R$ 5 bilhões até então depositados na Caixa Econômica Federal por contribuintes que questionam na Justiça o pagamento de tributos.
Como abril, outubro é um mês favorável para a arrecadação. No primeiro caso, por causa das declarações do IR das pessoas físicas. No segundo, por conta do cronograma de pagamento dos tributos incidentes sobre o lucro das empresas. Os superavit desses meses, portanto, não são padrão para o resto do ano. O superavit primário federal acumulado em dez meses ficará pouco acima dos R$ 26 bilhões, muito aquém da já reduzida meta anual de R$ 42,7 bilhões.