18/02/2019 Folha de São Paulo
O diretor de Previdência da Fenafisco (federação dos fiscos estaduais e federal), Celso Malhani, questiona como o governo pagará os atuais aposentados e os que ainda vão se aposentar pelo atual modelo de repartição sem os jovens.
"Em vez de desferir despropérios aos servidores, transformando-os em culpados pela crise fiscal, o governo que explique qual será a fonte de financiamento dos que vão se aposentar nos próximos 30 anos", afirmou Malhani. "De onde vai tirar o dinheiro? Essa é uma conta de trilhões. Quem vai arcar com ela?"
Funcionários do serviço público federal começam a reunir críticas à proposta de reforma da Previdência do governo Jair Bolsonaro. O alvo prioritário é o regime de capitalização.
O ministro Paulo Guedes (Economia) pretende implantar a novidade na aposentadoria dos jovens que ainda ingressarão no mercado de trabalho. A capitalização prevê que a aposentadoria será resultado da poupança feita pelo trabalhador ao longo da vida.
A inspiração é o modelo chileno, que implantou o regime de capitalização nos anos 1980, durante a ditadura do general Augusto Pinochet.
Os servidores federais defendem que a troca do atual regime de repartição —em que jovens contribuem para a aposentadoria dos que se retiram— vai prejudicar o trabalhador, uma vez que entregará ao sabor do mercado financeiro as remunerações dos futuros aposentados.
O diretor de Previdência da Fenafisco (federação dos fiscos estaduais e federal), Celso Malhani, questiona como o governo pagará os atuais aposentados e os que ainda vão se aposentar pelo atual modelo de repartição sem os jovens.
"Em vez de desferir despropérios aos servidores, transformando-os em culpados pela crise fiscal, o governo que explique qual será a fonte de financiamento dos que vão se aposentar nos próximos 30 anos", afirmou Malhani. "De onde vai tirar o dinheiro? Essa é uma conta de trilhões. Quem vai arcar com ela?"
Ele acrescentou que a prova de que o modelo não dá certo é que, no Chile, muitos têm chegado à idade de se aposentar com pensões muito abaixo do salário mínimo local, levando o governo a arcar com um auxílio aos aposentados. Mobilizações tomaram o país nos últimos anos de pessoas insatisfeitas com o regime previdenciário, levando o governo a propor mudanças.
O presidente da Anfip (Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal), Floriano Sá Neto, afirma que o governo elegeu como adversário o serviço público, embora o regime próprio de previdência dos servidores (RPPS) já tenha sido reformado em 2003. Ele apresentou cálculos que indicam que o atual deficit da previdência do funcionalismo público federal equivale a 1,1% do PIB e recuará para 0,6% em 2060.
"Mexer neste regime não vai gerar a economia prometida com a [fixação da] idade mínima. O deficit maior está no RGPS [regime de Previdência dos trabalhadores do setor privado]. Por que tentar resolver este problema com uma nova reforma em um regime que já foi reformado?", afirmou.
Sindicatos, federações, confederações e centrais que representam servidores e trabalhadores do setor privado organizam o relançamento da frente parlamentar em defesa da Seguridade Social no fim de março.
A frente está ativa desde 2016 e, em 2017, encabeçou a campanha que questionou o deficit da Previdência, alegando que as fontes de financiamento da Seguridade Social são desviadas para outras funções. O governo, no entanto, provou com dados que a informação não procede e o deficit existe e e crescente.
Segundo organizadores da frente, 50 assinaturas de deputados já foram colhidas —são necessárias 172 para a instalação de uma frente parlamentar.
No lançamento, os organizadores pretendem apresentar um filme explicando o que é capitalização e seus possíveis efeitos danosos. A ideia é trazer ainda um convidado chileno para dar testemunho do resultado do regime em seu país.
Nesta quarta-feira (6), representantes das organizações sociais que sustentam a frente se reuniram na Câmara dos Deputados para articular a oposição à reforma da Previdência.
Os servidores querem que o governo concentre esforços no aumento da arrecadação da receita previdenciária, reduzindo desonerações.
Floriano acrescenta que a reforma trabalhista aumentou o problema, pois desincentivou a contratação de trabalhadores formais. Com isso, o deficit previdenciário aumenta ainda mais.
A reforma permitiu a terceirização de atividades-fim pelas empresas e criou o regime de trabalho intermitente (com jornadas interrompidas), mas não desobrigou a formalização e o pagamento de contribuições previdenciárias.
"Os servidores e os trabalhadores da iniciativa privada não se furtam em debater a idade mínima, desde que comece pelo caminho certo, que e o foco na receita previdenciária", disse Malhani.