03/09/2019 Gaúcha ZH
Secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, o gaúcho Wagner Lenhart é o principal motor da reforma administrativa em preparação no governo federal.
À coluna, antecipou que haverá, sim, demissão por baixo desempenho, a estabilidade será revista e os concursos seguirão restritos. Com a reforma da Previdência encaminhada para votação dentro de cerca de um mês no Senado, e o avanço da reforma tributária, a administrativa é a próxima no calendário do Congresso. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já afirmou que é uma "prioridade" na pauta. Pelas estimativas de Lenhart, a expectativa é de que as mudanças entrem em vigor entre 2020 e 2021.
Em que situação está?
Está no plenário do Senado, já pode ser votado. Prevemos para 2020 ou 2021. Buscamos maior agilidade, capacidade de adaptação de novas demandas e, por isso, maior flexibilidade da gestão.
O governo reavalia a estabilidade do servidor?
Existem algumas carreiras para as quais se pode debater se a estabilidade, tal qual existe hoje, é salutar para a administração pública. Estamos avaliando as melhores práticas internacionais para preparar a administração pública de 2025, 2030. Analisamos o modelo do Reino Unido, um dos serviços públicos mais bem conceituados do mundo, o modelo de Portugal, que passou por processo semelhante em 2009, e nesse momento avalia os aprendizados de 10 anos.
Haveria dois tipos de carreira, um com estabilidade e outro sem?
Precisamos ter possibilidade diferentes de contratação. No Reino Unido, 94% dos servidores são contratados com regimes semelhantes ao privado, 6% são estatutários. No Brasil, 86% dos servidores são estatutários, até porque a Constituição prevê regime único de servidor público e 14% são tercerizados, estagiários, contratos de cargo em comissão. Pensamos em um sistema que ofereça alternativas ao gestor público: quando fizer sentido, contratar por projetos, se for melhor por estatuto, que se faça dessa forma.
Haverá concurso público?
Neste ano, fizemos nomeações de concursos realizados em anos anteriores, principalmente na segurança pública, que é prioridade. Temos mantido controle porque nos últimos 15 anos a máquina cresceu, tanto na administração direta quanto de empresas dependentes, em que o dinheiro sai do mesmo bolso. Temos de fazer uma pausa, pensar se precisamos dos profissionais e só contratar os realmente essenciais. Nenhum concurso foi autorizado neste ano. Publicamos um decreto com novas regras para concursos públicos, cada órgão que demanda servidores tem de refletir e apresentar para o Ministério da Economia a demanda para olharmos o todo e pensar onde utilizar os nossos recursos que são escassos. Há concursos rotineiros, como os dos ministério das Relações Exteriores e da Educação. Concurso neste momento é exceção, só será feito em caso de extrema necessidade.
Qual a alterativa para quem precisa de pessoal?
A movimentação de servidores dentro do próprio governo federal, há 620 mil servidores. Há muitos órgãos com excedentes e muitos que têm carência de servidores, a possibilidade de movimentação interna servirá para fazer esse equilíbrio.
Que regras será preciso alterar para fazer essa movimentação?
Mudar leis, editais de concurso público, para deixar mais aberto. Do jeito que está hoje, teremos muita dificuldade no futuro, pela rigidez. Para sermos capazes de entregar melhor saúde, educação e segurança para a população, vamos precisar de um governo mais ágil e flexível.
Qual o caminho para a reforma do Estado?
O primeiro passo foi estudar as informações de dentro do governo, entender como funciona a estrutura de gestão de pessoas do governo federal. O segundo, buscar as melhores práticas no setor privado e referências internacionais. Reino Unido, Portugal, Singapura, Chile, a França, que há poucas semanas aprovou uma reforma administrativas, estão em estudo. Também buscamos recomendações de organismos internacionais, como a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que reúne países desenvolvidos). O Brasil tem abertamente a pretensão de fazer parte da OCDE, que apresentou uma série de recomendações para o tema. Antes mesmo de eles publicarem, muitos pontos já estavam sendo trabalhados, então, já tem muita coisa alinhada.
Qual as bases da reforma?
Uma é a gestão de desempenho, pois hoje existe avaliação de desempenho nas três esferas (federal, estadual e municipal). Na maioria das vezes, temos um grupo muito grande com notas máximas ou muito próximo, então, acaba não correspondendo a verdade. Nem mesmo as organizações mais bem-sucedidas do mundo têm 100% dos seus colaboradores como profissionais de excelência. Outro ponto é revisitar os planos de carreira, que tem estrutura extremamente complexa. São cerca de 150 planos de carreiras destintos, com cerca de dois mil cargos e cerca de 250 tabelas remuneratórias distintas. Há uma infinidade de gratificação, de bônus, de promoção, é uma estrutura que dificulta muito a gestão de pessoas e dificulta muito a mobilidade e flexibilidade. Estudamos unificar muitas carreiras, para termos estrutura mais fácil de gerir e de movimentar.
Reduzir o número de servidores é um objetivo?
Temos aproximadamente 100 mil servidores que já reúnem condições para se aposentar. São cem mil de 620 mil ativos e 650 mil inativos. Isso só do executivo civil, não inclui estatais dependentes, que têm mais 77 mil, nem militares. Dos 100 mil, dois terços são cargos com exigência de Ensino Fundamental ou Médio, são cargos de auxiliares, os mais impactados pela terceirização que ganhou força no governo federal nos últimos anos. É tendência para cargos de apoio. Desse total, um bom contingente não vai precisar ser reposto, outros sim. Você acaba diminuindo a necessidade desse tipo de mão de obra.
Qual a avaliação sobre a resistência dos servidores às mudanças?
Faz parte. Toda mudança gera desconforto, desconfiança. Vamos ser transparentes e mostrar os motivos. Uma preocupação é ter cada ponto embasado em estudos, referências, evidências, em práticas internacionais ou de mercado, para quando fizer conversas com sindicatos, sociedade civil e Congresso, estejamos seguros. Tudo será fruto de reflexão e não de opinião pessoal. Queremos fazer uma mudança estrutural que prepare o país para os próximos anos e seja uma mudança positiva, primeiro, para a população. Temos insistido que o governo federal só existe para servir a população. Então, esse foco central é no que a população mais precisa e onde mais precisa: educação, saúde e segurança. Também queremos criar ambiente de trabalho mais desafiador para o próprio servidor, que se sinta realizado que entenda a importância de seu serviço na ponta. Queremos transformar a visão de como a população enxerga o serviço público e até com o próprio serviço público se enxerga.