30/09/2019 Valor Econômico
O ministro da Economia, Paulo Guedes, e a cúpula do Congresso Nacional avançaram na ideia de criar uma comissão mista para analisar a reforma tributária, com o objetivo de acelerar a tramitação da proposta de emenda constitucional (PEC) nas duas Casas. As negociações envolvem colocar o senador Roberto Rocha (PSDB-MA), relator da proposta no Senado, para presidir o colegiado, enquanto o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), relator da reforma na Câmara, repetiria a função na comissão mista.
“Ficou definida a criação de uma comissão mista para construir um texto em conjunto e evitar um bate-cabeça entre as duas Casas”, disse uma fonte que participou do encontro. Essa comissão não terá poder de fazer a reforma tramitar pelo Congresso. Seria mais um ato político, para colocar senadores e deputados na mesma mesa de negociações, mas após isso a nova versão do texto teria que tramitar normalmente pela Câmara e Senado.
O colegiado ainda enfrenta resistências, como do presidente da comissão da Câmara, deputado Hildo Rocha (MDB-MA) - que, na comissão mista, perderia função. “Essa comissão não serve para nada, não tem como decidir”, disse o emedebista. Já o relator do Senado destaca que o colegiado “tecnicamente não teria valor nenhum”, mas politicamente poderia ser a saída.
Guedes prometeu enviar na próxima semana sua proposta para a reforma tributária. É possível que siga para o Legislativo apenas uma parte das mudanças pretendidas pelo governo: a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dos tributos federais, a começar pelo PIS-Cofins.
O restante da reforma ainda está em estudos. A “faxina” nas deduções e a redução das alíquotas do Imposto de Renda não ficaram prontas. Além disso, a desoneração da folha salarial ficou em suspenso depois que o governo abandonou a ideia de criar um tributo sobre transações.
No Ministério da Economia, avalia-se que a simplificação do PIS-Cofins já terá um impacto muito importante sobre o cotidiano das empresas. A legislação desses tributos tem 2.000 páginas e não há, nem na Receita Federal, um especialista que domine totalmente esse emaranhado de regras. O IVA federal deve acoplar-se à versão da reforma que está em tramitação na Câmara, que cria o mesmo tributo nos níveis estadual e municipal.
A reforma tributária é um dos seis itens da agenda legislativa acertada por Guedes com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), na noite de quarta-feira, quando ficou decidido também a promulgação de parte da PEC da cessão onerosa, para viabilizar o leilão do pré-sal em novembro. Dos seis itens, três ainda nem têm proposta do governo no Congresso: as reformas tributária, administrativa e a privatização da Eletrobras.
Além desses itens, também foram discutidos a autonomia para o Banco Central, a PEC da Regra de Ouro e o plano de ajuste fiscal dos Estados, batizado de “Plano Mansueto”. Os três estão na Câmara, mas com divergências que têm impedido o avanço. No entorno de Maia, o pacote é considerado excessivamente ambicioso e que, no curto prazo, apenas a conclusão da análise da cessão onerosa, com a distribuição dos recursos para Estados e municípios, tem chances de ser concluída, acreditam os técnicos.
Questionado sobre a viabilidade da votação de toda a agenda, Maia foi lacônico. “Vamos ver. Tem de esperar”, disse ao Valor.
A reforma administrativa, que entre outras medidas deve reduzir os salários de ingresso no funcionalismo público e propor o fim da estabilidade, ainda está nos escalões técnicos do Ministério da Economia. Ainda falta a validação da proposta pelo ministro e pelo Planalto antes de seguir para o Congresso.
O governo tem pronto projeto de lei para privatização da Eletrobras, que depende de aval do Congresso, mas aguarda o melhor timing político para envia-lo. A proposta encontra dificuldades no Legislativo. Alcolumbre já declarou que há grandes resistências de parlamentares do Norte e do Nordeste, entre os quais ele próprio se incluiu. Para diminuir as resistências, discutiu-se na reunião replicar o modelo de comissão mista com deputados e senadores para este projeto e o plano Mansueto.
O ministro também avisou na reunião que deve mandar uma PEC própria, na próxima semana, para a PEC da Regra de Ouro, que cria gatilhos para o governo cortar despesas e não cometer um crime fiscal (que pode causar até um impeachment do presidente). O deputado Pedro Paulo (DEM-RJ) já tem proposta nesse sentido, que tramita desde 2018, mas ela padece do mesmo mal da reforma tributária: ciúme.
Os senadores acham que a PEC exagera o protagonismo da Câmara na agenda econômica. Pedro Paulo contou que reuniu-se com Alcolumbre para explicar que a proposta é diferente do pacto federativo que, pelo acordo entre Maia e Alcolumbre, tramitará primeiro no Senado. A PEC resolve uma situação no curto prazo, enquanto o pacto é mais abrangente, disse o autor. O governo sinalizou que enviaria ao Senado, mas, por conta do impasse, ainda não há certeza sobre isso.