05/11/2019 Gaúcha ZH
A menos de 60 dias do fim do ano e correndo o risco de fechar 2019 com duas folhas de pagamento em atraso, o governo Eduardo Leite se prepara para parcelar o 13º salário dos servidores do Executivo mais uma vez. A decisão será tomada ao longo deste mês e, se confirmada, terá de passar pelo crivo da Assembleia Legislativa.
Caso a tendência se mantenha, será o quinto ano consecutivo de parcelamento via empréstimo bancário (leia mais detalhes no fim do texto).
Em 2018, o funcionalismo teve de escolher entre duas opções: ganhar a gratificação natalina no prazo, tomando dinheiro emprestado (do Banrisul ou de outros bancos), ou receber o valor fracionado, nos 12 meses seguintes. Em ambas as situações, o Estado assumiu o compromisso de bancar a conta e garantiu indenização de 1,5% ao mês sobre o saldo devedor, para cobrir juros e custos da operação.
De lá para cá, as condições financeiras se degradaram. Leite viu naufragar a venda de ações do Banrisul e, até agora, não conseguiu concluir a adesão ao regime de recuperação fiscal, que permitiria a antecipação de recursos das privatizações. Apresentou uma série de propostas de ajuste fiscal, mas ainda precisa de aval do Legislativo para aplicar as medidas.
Mesmo que os R$ 450 milhões do leilão do pré-sal ingressem em caixa até dezembro, que a arrecadação cresça em razão do IPVA e que o Estado lance novo programa de refinanciamento de dívidas tributárias, a verba amealhada tende a ser insuficiente para resolver todos os problemas – uma folha mensal custa R$ 1,5 bilhão em valores brutos. A previsão é de que os salários de outubro sejam quitados apenas em 13 de dezembro. Fora isso, ainda haverá os vencimentos de novembro e de dezembro pela frente.
— À medida que chegamos ao final do ano, sentimos com mais força os efeitos dos dois meses de atraso que herdamos (parte da folha de dezembro de 2018, mais a de janeiro de 2019). A situação vai convergindo para os dois salários (em atraso) de novo — admite o secretário da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso.
Cauteloso, o economista evita fazer projeções, reforça a preocupação do governo com os servidores e com a regularização da folha e ressalta que ainda não foi batido o martelo sobre o parcelamento do 13º. Apesar disso, reconhece que o quadro "é bastante complexo":
— Não sendo possível pagar o 13º esse ano, a gente pretende oferecer, no mínimo, a mesma alternativa que o servidor tinha nos anos anteriores (do empréstimo bancário). Isso vai ser decidido ao longo de novembro e terá de passar pela Assembleia.
O último projeto do tipo, de dezembro de 2018, foi aprovado por unanimidade no parlamento. Desde janeiro, contudo, o Banrisul responde a um processo na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) devido à operação. Conforme o secretário, trata-se de solicitação de esclarecimentos. Cardoso nega que isso possa trazer dificuldades.
Não conheço os detalhes, porque não sou parte (no processo), mas sei que é um pedido de esclarecimento e que não há nenhum impedimento (a novas operações). É uma preocupação normal, usual do órgão regulador — pondera o secretário.
Procurada por GaúchaZH, a assessoria do Banrisul informou que a direção não comentaria o assunto. A reportagem pediu à CVM para ter acesso à íntegra do processo, mas, até a última sexta-feira (1º), o pedido seguia em análise, sem definição.
A Federação Sindical dos Servidores Públicos do Estado (Fessergs) prevê um Natal melancólico para o funcionalismo. Conforme o presidente da entidade, Sérgio Arnoud, há "descontentamento geral" em relação ao pacote do governo Eduardo Leite, que propõe mudanças nas carreiras e nas regras previdenciárias, e à falta de perspectivas salariais. São 47 meses de parcelamentos no Executivo.
— Estamos no limite. Já sabemos que não vamos poder contar com o salário de dezembro, e é uma barbaridade ter de recorrer ao Banrisul outra vez para receber o 13º, mesmo que o governo pague os juros. A atual gestão está se valendo das mesmas alternativas da gestão anterior. Estamos à deriva — diz Arnoud.
Secretário da Fazenda nos últimos anos do governo de José Ivo Sartori, Luiz Antônio Bins defende o parcelamento via empréstimo bancário. Na avaliação dele, a atual gestão "não tem alternativa" diante do quadro crítico das finanças. Nesse cenário, Bins considera a opção "boa para o Estado, para o banco e para o funcionalismo".
— O Estado pode até atrasar os salários de novembro e dezembro, mas não pode atrasar o 13º, porque geraria problemas lá na frente. Repetir a operação realizada com sucesso nos anos anteriores é uma forma de dar segurança aos servidores. Não fazê-la geraria um desgaste enorme — avalia Bins.