30/09/2020 O Globo
O Ministério da Economia colocou em sigilo todos os documentos que produziu para elaborar a proposta de emenda constitucional da reforma administrativa. A pasta negou pedido feito com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), alegando que só poderá divulgar os estudos e demais manifestações depois que o Congresso aprovar a PEC.
A decisão do ministério vai contra precedentes julgados pela Controladoria Geral da União (CGU) que, em casos idênticos ocorridos no governo Temer e também na gestão Bolsonaro, estabeleceu que os chamados "documentos preparatórios", no caso de uma PEC, são públicos a partir do momento que a proposta é enviada ao Legislativo.
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"A matéria está pendente de ato decisório conclusivo, tendo em vista que é uma Proposta de Emenda Constitucional - PEC, a qual ainda encontra-se em análise no Congresso, somente podendo ser tido como editado após a conclusão de toda a tramitação necessária", informou o ministério em resposta enviada ontem a pedido formulado pelo GLOBO.
Na resposta, o ministério cita artigo 20 do decreto 7.724, que regulamentou a Lei de Acesso à Informação. O trecho do decreto é justamente o que autoriza a divulgação de documentos preparatórios após edição de ato administrativo.
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Essa não é a primeira vez que o Ministério da Economia insiste em manter em sigilo documentos que já deveriam ser públicos. Em abril do ano passado, ao receber pedido semelhante de acesso aos documentos que foram usados para elaborar a PEC da Previdência, a gestão do ministro Paulo Guedes também quis manter os registros em segredo.
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Ele alegava que a divulgação poderia prejudicar a tramitação da PEC no Congresso. Com a divulgação do sigilo imposto aos documentos, o ministério passou a ser criticado no Congresso e acabou liberando o acesso a todos os cálculos e pareceres que havia produzido para elaborar a PEC da Previdência.
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Dessa vez, a divulgação dos documentos utilizados para elaborar a reforma Administrativa pode trazer motivos de preocupação ao governo. O texto da proposta de emenda constitucional ficou retido por vários meses na Casa Civil e sofreu inúmeras alterações.
A divulgação dos documentos pode ajudar a contar como a reforma teve que ser ajustada dentro do governo já que a proposta original não teve o apoio inicial do presidente Jair Bolsonaro.
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Em 2017, quando o governo do então presidente Michel Temer enviou sua PEC da Previdência ao Congresso, o GLOBO fez pedido semelhante ao Ministério da Fazenda, que liberou o acesso a boa parte dos documentos sem fazer qualquer restrição, mesmo com a PEC ainda em tramitação no legislativo.
Na época, foi a Casa Civil quem barrou a divulgação de documentos preparatórios da PEC também sob a alegação de que era preciso esperar a aprovação por deputados e senadores.
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Os casos precedentes de negativa de acesso já julgados pela Controladoria Geral da União mostram que o sigilo imposto é indevido. "Entende-se que a salvaguarda legalmente atribuída aos documentos que fundamentaram a referida PEC se exauriu no momento em que a mesma foi apresentada ao Congresso Nacional", manifestou-se a CGU em 2017.
A partir desse entendimento a controladoria procurou a Casa Civil, na gestão Temer, e solicitou que o órgão entregasse os documentos, o que foi feito.
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No caso da PEC da Previdência já na gestão Bolsonaro, a CGU manteve seu entendimento. "Embora a LAI e o seu decreto regulamentador não citem expressamente o momento em que se dá a decisão final do processo em tela, entende-se que, com a finalização do texto da PEC e seu encaminhado ao Poder Legislativo, a decisão final que cabe ao Poder Executivo já foi devidamente tomada", manifestou-se a CGU em parecer.
A controladoria não precisou convencer Guedes a entregar os documentos porque o ministério, diante das pressões públicos, se apressou a divulgá-los em seu site.
Procurado, o Ministério da Economia declarou, por meio de nota, que a resposta ao pedido formulado por meio da LAI considerou, em análise de primeira instância, que "o material solicitado só perde seu caráter restrito apenas quando a matéria estiver finalizada, ou seja, com o seu ato decisório definitivo, o que se dará com a conclusão da tramitação no Congresso Nacional. O GLOBO recorreu da decisão e o ministério disse que o recurso será respondido dentro do prazo legal, que é de cinco dias.