11/03/2022 Ádila Marcele de Lima Silva e outros autores | JusBrasil
O Direito Administrativo surge com instrumento importante, que rege a organização e o exercício do Estado. Assim, faz-se compostos de órgãos, de agentes públicos e das atividades públicas. A Reforma administrativa surge com o diálogo diminuir os gastos públicos através de cortes em contas públicas. O governo Bolsonaro, com a PEC 32/2020, coloca o Estado Brasileiro como subsidiário à iniciativa privada e passa a proibir, portanto, o Estado de adentrar em vários setores da economia. No entanto, a Constituição Federal de 1988, prevê que o Estado garantirá os direitos sociais, enquanto a iniciativa privada presta seu papel complementar. A presente Reforma introduz, desse modo, a ideia de rotatividade na prestação de serviços público, alterando, de forma significativa, os direitos no funcionalismo público.
Logo, o presente trabalho analisará, no primeiro momento, a origem e histórico do direito administrativo, relatando seu surgimento através das ideias filosóficas que influenciaram a Revolução Francesa. Em consequência, aborda-se o Direito Administrativo a partir da Constituição de 1934, em que se institui o Estado Social, até as bases do constitucionalismo e do ramo administrativo na Constituição Federal de 1988. Já e um segundo momento, far-se-á a observação de como o Texto Magno atual prevê direitos e garantias aos agentes públicos e os poderes conferidos a tais em relação função desempenhada, os quais agem em prol da Administração Pública e seus princípios, e não em benéfico próprio. Com isso, constata-se que a proposta altera os futuros servidores e empregados público.
Dessa forma, o presente estudo possui o escopo de demonstrar como as ideias reformistas na Administração Pública conferem uma maior autonomia aos chefes do Poder Executivo. Em um terceiro momento, alude-se para sobre os interesses políticos- eleitorais com a PEC 32/2020, trazendo-se o fenômeno da “municipialização” dos serviços públicos e as possíveis implicações dessa arbitrariedade dos governantes no funcionalismo público. Como um argumento para fomentar a aprovação da PEC, consiste o viés neoliberal e reformista do presidente Jair Bolsonaro em campanha eleitoral, o que escancara os ideais político-eleitorais na tentativa de aprovação da PEC. Em um quatro momento, versa-se acerca da importância da codificação do Direito Administrativo, visto com instrumento a limitar as alterações de caráter-eleitoral, para evitar as peripécias baseadas em convicções de políticos.
Este artigo limita-se, portanto, ao estudo bibliográfico, utilizando-se da pesquisa e o levantamento de obras e dados, mediante abordagens da bibliografia publicadas em forma de livro e artigos científicos, com o objetivo de discutir a relação do Direito Administrativo com a Política, a fim de embasar a influência ideológica na proposta da Nova Administração Pública trazida pelo Presidente da República. Sendo assim, objetiva-se responder que a PEC 32/2020 está em contradição aos pressupostos básicos da função de Estado. Evidencia-se, no trabalho, que a supracitada não soluciona o que pretende resolver, tampouco traz as mudanças eficientes ao serviço público, somente justifica um ataque ao funcionalismo público brasileiro mediante desconstitucionalização de direitos e das garantias de estabilidade em direção àqueles que prestam o serviço estatal.
1 ORIGEM E HISTÓRICO DO DIREITO ADMINISTRATIVO
O Direito Administrativo surgiu no final do século XVIII e início do século XIX, juntamente com o constitucionalismo, sendo influenciado por ideais filosóficos que incentivaram a Revolução Francesa e originaram os princípios da separação de poderes, da isonomia, da legalidade e do controle judicial.
Outrossim, o Direito Administrativo é um dos ramos do Direito Público, visto que rege a organização e o exercício de atividades do Estado com o propósito de satisfazer os interesses públicos. Com isso, Hely Lopes Meirelles (2006 apud ALEXANDRINO, 2021, p. 47) conceitua o direito administrativo como “conjunto harmônico de princípios jurídicos que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado”. Assim, o Direito Administrativo está em constante evolução, dado que luta pela proteção dos direitos individuais. Por isso, tal ramo do direito se desenvolve por meio de períodos de constitucionalização, de humanização e democratização, sendo ligado às fases do desenvolvimento do Estado de Direito (Liberal, Social e Democrática).
A constitucionalização do Direito Administrativo iniciou com a Constituição Federal de 1934, embora tenha se fortalecido devido à Constituição Federal de 1988 e se reforçado mediante as Emendas Constitucionais. Nesse sentido, durante a década de 30, o Direito Administrativo se desenvolveu, por consequência da própria revisão constitucional de extensão da atividade do Estado no âmbito socioeconômico. Destarte, a Constituição Federal de 1934 instituiu o Estado Social de Direito, que assume caráter social, uma vez que o Estado começa a atuar no campo da educação, saúde, higiene, economia, assistência e previdência social. Logo, a máquina estatal foi ampliada e, em sequência, aumentou-se o quadro de funcionários públicos necessários para fornecer atendimento às novas tarefas atribuídas ao Estado.
Ademais, a Carta Magna de 1988 institui o Estado Democrático de Direito, uma vez que as ideias essenciais a esse tipo de Estado são a ampliação do princípio da legalidade e a ideia de participação do cidadão na gestão e no controle da Administração Pública. Sendo assim, é necessário salientar a importância da Constituição Federal de 1988 e as suas emendas constitucionais ao fortalecer a constitucionalização do Direito Administrativo, visto que assegurou garantias e direitos fundamentais aos servidores públicos.
A Administração Pública é o conjunto de órgãos e pessoas jurídicas que desempenham funções administrativas e políticas sendo subordinados ao direito, isto é, à Constituição Federal e aos princípios jurídicos. O funcionalismo público é a nomeação dada ao quadro de servidores que são empregados a fim de sustentar o bom funcionamento das políticas e serviços públicos. Nesse aspecto, o funcionalismo público brasileiro é responsável por milhares de serviços estabelecidos à sociedade, em diferentes áreas como saúde, educação, segurança, mobilidade entre outros. Max Weber (1920 [2014] apud OREIRO; FERREIRA-FILHO, 2021, p. 493), destaca que o Estado Moderno está centrado “nas mãos do funcionalismo, porém devem ser separados por alta impessoalidade”. Logo, percebe-se a importância da atuação estatal ao fornecer serviços públicos de qualidade para a comunidade social.
Atualmente, existe um debate em torno da dimensão do Estado, uma vez que há quem defenda que a intervenção estatal é excessiva, enquanto outros sustentam a ideia de que o Estado deveria ampliar a sua atuação em mais áreas ou iniciativas. Nesse cenário, surge a Reforma Administrativa (PEC 32/2020), uma proposta elaborada pelo Governo Bolsonaro, que visa o aperfeiçoamento da máquina pública, com mecanismos de gestão modernos e flexíveis, especificamente por meio da delimitação de gastos públicos e aumento da eficiência administrativa. No entanto, a PEC 32/2020 pretende extinguir direitos e garantias dos servidores públicos que foram conquistados por vias democráticas e são assegurados pela Constituição Federal de 1988.
2 A FUNÇÃO DO ESTADO NA ADMINISTRAÇÃO E OS POSSÍVEIS DESDOBRAMENTOS COM A REFORMA ADMINISTRATIVA
Na Constituição Federal de 1988, em seu art. 2º discorre que são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (BRASIL, 1988), dessa maneira, no papel desempenhado entre os poderes, não haverá interferência, sendo possível uma atuação de maneira cooperativa entre eles. Assim, dentre as diversas funções exercidas por este, o Poder Executivo apresenta a função administrativa, a qual consiste na defesa concreta do interesse público. Portanto, aos agentes públicos que desempenham a função administrativa, a legislação confere poderes especiais e prerrogativas cujo uso está intrinsecamente vinculado à defesa do interesse coletivo.
Sendo assim, não se trata de poderes conferidos em favor da pessoa do agente, mas em razão da função desempenhada, ou seja, o agente público não pode utilizar-se de tais prerrogativas para benefícios próprios ou para favorecer alguém, agindo, consequentemente, de maneira impessoal e infringindo princípios norteadores da Administração Pública. É necessário ressaltar que estes poderes se referem ao cargo ocupado pelo agente público e estão sempre submetidos ao cumprimento de deveres (MAZZA, 2021, p. 155-156).
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 32), apresentada pelo Poder Executivo vai em contradição aos pressupostos básicos da função do Estado, tendo em vista, que tal proposta irá afetar diretamente as funções desempenhadas pelos futuros servidores públicos tornando-os leais não ao cargo que ocupam e sim ao líder político, gerando uma submissão em relação ao agente público que ocupa o cargo no momento, tornando o trabalho mais controlado de acordo com os moldes e a forma de governo, em razão da estabilidade não ser mais um critério na maioria dos cargos do serviço público com a Reforma Administrativa.
Dessa maneira, levando em consideração que uma das alterações de destaque na Reforma tem como objetivo conferir maior autonomia ao Presidente da República, como também os demais Chefes do Poder Executivo, para determinar a organização da Administração Pública, com a possibilidade de criação, modificação e extinção de cargos e órgãos públicos por meio de decreto, além da demissão e substituição destes funcionários. Por conseguinte, reduz-se os servidores os quais são regidos por uma rigorosa regulamentação com deveres e proibições, substituindo-os por uma atuação mais arbitrária e vinculada a interesses políticos, em razão da relação de lealdade necessária à manutenção do cargo público.
O argumento principal do atual Governo e autor da Proposta da Emenda à Constituição é enxugar a máquina pública e acabar com os “privilégios” do serviço público. No entanto, a estabilidade não é uma mera vantagem institucional, mas, sim, uma maneira de assegurar aos servidores que sua atuação na administração pública seguirá em conformidade com os princípios constitucionais e sem intervenção direta de cada líder político.
Além disso, reformas administrativas pautadas em pressupostos privatizadores parecem ir de encontro ao que pretendem solucionar, contudo, seu objetivo principal é enfraquecer o contexto normativo na prestação do serviço público, buscando os serviços terceirizados, não vinculados à supervisão da Administração Pública, o que torna mais difícil a monitoração e contestação de sua atividade. Por conseguinte, haverá menor transparência das atividades realizadas por particulares, dificultando a fiscalização e a própria participação dos cidadãos na atuação administrativa.
3 RELAÇÃO ENTRE OS INTERESSES POLÍTICO-ELEITORAIS E A PROPOSTA DE REFORMA ADMINISTRATIVA DE 2020
A Proposta de Emenda à Constituição n. 32/2020, apresentada pelo Poder Executivo, através da Presidência da República, possui o escopo de alterar as regras sobre futuros servidores e empregados públicos, bem como preconiza mudar os setores da organização da administração pública direta e indireta dos poderes da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal (MEDEIROS, 2020). O principal argumento utilizado para fomentar a necessidade de aprovação da PEC da Nova Administração Pública consiste em uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro, eleito por meio de uma agenda de viés neoliberal e reformista, de contenção das contas públicas mediante uma maior flexibilização e modernização da administração pública.
Notadamente, a agenda neoliberal do presidente tem influenciado nas propostas e atuações do governo Bolsonaro e, por isso, no anseio de enxugamento da máquina estatal e dos gastos públicos, na vontade de transformar o Estado no mínimo possível, oferecendo uma melhor eficiência no funcionalismo público nacional sob o objetivo de acabar com os privilégios. Para atingir tal objetivo, a proposta do governo busca alicerces em uma maior autonomia aos chefes do Poder Executivo, seja na esfera federal, municipal ou estadual, tanto na criação quanto na modificação e extinção de cargos públicos através de decretos, sendo dispensada a aprovação do Legislativo, o que configura, para o presidente, prefeitos e governadores, uma maior liberdade para organizar a Administração Pública.
Ademais, há previsões de restrição de concursos e de cargos de estabilidade. É importante destacar, neste ponto, que a garantia de estabilidade do servidor público, evidentemente, não se configura como um privilégio para eles, mas, sim, afigura-se como um instituto que protege as atividades administrativas de influências político-eleitorais e da ocorrência de demissões injustas. Logo, especialistas apontam uma tendência reformista e liberal, além do domínio de ideais político-partidárias no serviço público, advindo através das pautas da Reforma Administrativa desenvolvida pelo Governo Federal (MEDEIROS, 2020).
Ressalta-se que, atualmente, a Carta Magna de 1988 institui, em seu art. 41, a regra em que todo servidor público nomeado para cargos em virtude de concurso público é estável após três anos de exercício efetivo (BRASIL, 1988). No entanto, isso não faz com que ele não possa perder seu cargo, haja vista que § 1º, no art. 41, do mesmo diploma legal, elenca possibilidades de perda de emprego. Assim, a propensão à precarização dos direitos dos servidores públicos, além de desconstitucionalizar garantias destes, estimula uma relação de subserviência entre agentes públicos e governantes, pois estes últimos poderão demitir e substituir aqueles com maior facilidade.
3.1 Alguns efeitos da retirada de direitos dos servidores públicos diante do fenômeno da “municipialização”.
Nesta perspectiva, a título de ilustração dos efeitos dessa “desconstitucionalização” de direitos dos servidores públicos, conforme dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), reproduzidos pelo jornal Brasil de Fato, em 2020, no funcionalismo público nacional, houve um aumento do fenômeno chamado de “municipialização” dos serviços públicos após o advento da Constituição Federal de 1988, em que os Municípios garantiram a competência de prestação de serviços que visem o Estado do Bem-Estar Social, tais como saúde, educação e assistência social (FERREIRA, 2020). Através dessa visão de aumento das atribuições dos Municípios brasileiros, os levantamentos do IPEA advertem:
Nove em cada dez servidores públicos estão nos Estados e Municípios, segundo os dados apresentados pelo IPEA, e seis em cada dez servidores estão nos Municípios. Na década de 50 os servidores públicos municipais consistiam em 15% do funcionalismo público no Brasil, em 2018 consistem em 60%! Os servidores públicos estaduais eram 50% e agora estão em torno de 10%. Já os servidores públicos federais eram 35% e agora são 30%, o nível que mais se manteve estável (FERREIRA, 2020).
Portanto, conclui-se que, além da tentativa de desmonte do funcionalismo público, no Brasil, a partir da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020, a retirada da estabilidade do agente público se configura como um atentado à fruição das atividades do Estado de Direito. Neste sentido, a submissão de agentes públicos a mandatos e influências de agentes políticos instiga “a volta do coronelismo político às práticas locais, onde os servidores e os serviços públicos ficam vulneráveis aos sujeitos politicamente empoderados” (FERREIRA, 2020), vilipendiando valores constitucionais, os quais gerem a Administração Pública direta e indireta, elencados no art. 37 da Carta Magna, e comprometendo a função administrativa do Estado, tal como a eficiência dos serviços prestados por este.
Consequentemente, pode-se inferir que a Nova Administração Pública não resolve os problemas econômicos que promete solucionar, tampouco aperfeiçoa o serviço público. Somente tenta impor convicções de políticos para justificar mudanças brutais ao Texto Magno, de acordo com a discricionariedade e arbitrariedade do Governo Federal, violando princípios administrativos e democráticos, como o da eficiência da Administração Pública e da legalidade, bem como a participação dos cidadãos na atuação administrativa (MARQUES; BARBOSA).
Sendo assim, no intento de resolver impasses entre as intervenções de concepções político-partidárias na gerência da Administração Pública e no alcance do interesse público, a doutrina elenca a codificação do Direito Administrativo como possível solução, debatida no tópico a seguir.
4 A IMPORTÂNCIA DA CODIFICAÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO PARA O FIM DA DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO DOS DIREITOS
As Reformas Administrativas que modificaram o aparato jurídico tinham inúmeros propósitos a depender das necessidades existentes à época e, embora não tenham solucionado todas as demandas, houve um nítido avanço no tocante à burocracia pública. Nessa senda, um exemplo foi a realização da diminuição de burocracia para melhorar o funcionamento do serviço público em todos os seus âmbitos, facilitando o acesso do cidadão. Este, todavia, não é o desígnio da PEC 32, pois não apresenta propostas de mudanças realmente eficientes para o funcionalismo do serviço público (OREIRO; FERREIRA-FILHO, 2021, p. 488-492).
Ademais, essa Proposta de Emenda Constitucional apresenta um caráter de desconstitucionalização de direitos, regulamentando temas antes abordados pela Carta Maior, agora regulamentados por leis. Nessa perspectiva, os debates em relação a codificação do Direito Administrativo, visando puramente o progresso jurídico, compactuaria para moderação de Reformas Administrativas no ordenamento, pois, segundo Hely Lopes Meirelles:
As leis esparsas tornam-se de difícil conhecimento e obtenção pelos interessados, sobre não permitirem uma visão panorâmica do Direito a que pertencem. Só o código remove esses inconvenientes da legislação fragmentária, pela aproximação e coordenação dos textos que se interligam para a formação do sistema jurídico adotado (MEIRELLES, 2016, p. 50).
Nesse contexto, o processo de codificação, segundo Carlos S. de Bairro Júnior, concretiza vantagens, tendo em vista que existe o exercício de apuração e agrupamento metódico das normas, minimizando a legislação de possíveis erros, contradições ou outros defeitos, melhorando o esclarecimento acerca dos conceitos e difundindo o conhecimento das leis (SANTOS, 1919, p. 2). Assim, com base no que foi abordado em relação PEC 32/2020, é possível observar que a codificação poderia limitar as alterações de caráter político-eleitoral declaradas pelo atual presidente, já que as necessidades de modificação, com a existência de um código, não poderiam destoar do texto constitucional, estando esse seguro de alterações, e os servidores públicos dos seus direitos elencados constitucionalmente.
Insta destacar que, embora o Direito necessite estar a par da realidade social, as mudanças na Constituição geram instabilidade e insegurança jurídica diante das crescentes Propostas de Emendas. Certamente, a falta de segurança jurídica acarreta a incerteza dos cidadãos em relação aos seus direitos e deveres e, ainda mais, ao Estado, aos governantes e aos gestores no desempenho adequado de seu papel (ABRAHAM, 2021). Portanto, ainda que não seja unificado o pensamento em relação a codificação do Direito Administrativo pelos doutrinadores, é evidente que a condensação em um código, proporciona a segurança jurídica necessária, oferecendo “melhores possibilidades de controle e aperfeiçoamento [...]” do Direito Administrativo (MEIRELLES, 2016, p.51).
Portanto, a sistematização do Direito Administrativo, não é uma discussão inquestionável, visto que inexiste um pensamento único acerca dessa possibilidade, pois há também aqueles que não apoiam a codificação do ramo ou orientam, somente, a sua codificação parcial. Todavia, o debate no tocante às suas possibilidades carecem de atenção pelos legisladores brasileiros, haja vista as vantagens que oferecem para o funcionalismo público, em que podem assegurar as benesses que as reformas se propõem a realizar, além de garantir segurança jurídica e progresso jurídico, com o fim das leis fragmentadas e esparsas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer do presente estudo, foi abordado a origem e o histórico do Direito Administrativo até a constitucionalização dos serviços prestados pelo Estado com a CF/88 e, a partir disso, deu-se ênfase na Reforma Administrativa e suas mudanças no funcionalismo público. A PEC 32/2020 propõe a criação de novos vínculos jurídicos dos servidores públicos com os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário nas esferas Federal, Estadual e Municipal. A referida reforma propôs mudanças nas formas de contratação, através da extinção de direitos e garantias, tais como, a estabilidade, a limitação de concursos, adicionais de tempo de serviço, promoções e progressões por tempo de serviço.
Diante disso, o texto apresentado ao Congresso Nacional prevê poderes em demasiado aos chefes do Executivo (presidentes, governadores e prefeitos), para modificar, extinguir e criar cargos e órgãos públicos por meio de decretos. Portanto, a proposta de reformismo revela a vulnerabilidade em que se encontram os agentes públicos com a aprovação deste documento. Faz-se importante mencionar, por exemplo, que as garantias das quais possuem os servidores os protegem contra o abuso de poder dos agentes políticos. Dessa forma, essas assegurações trazidas pela própria Constituição e pelo Direito Administrativo aludem para evitar os palcos de nepotismo através dos contratos por prazo determinado.
Com isso, uma das discussões sobre a reforma administrativa é sobre a eficácia ou não da prestação de serviços estatais à sociedade, uma vez que a máquina pública precisa de um corpo de funcionários públicos, formandos de servidores estatutários, para seu correto funcionamento. Dessa forma, o fim da estabilidade do servidor público gera a descontinuidade administrativa e acarreta a perda da memória técnica e cultural das organizações. Diante disso, o instituto da estabilidade garante ao trabalhador efetivo que este não sofra perseguição de caráter político-partidário e ideológica, ao contrário de servidores que foram selecionados, por exemplo, através processo seletivo simplificado de contrato por prazo determinado, como consta na PEC 32/2020.
Constata-se, com o presente trabalho, o evidente descaso com o funcionalismo público e com a própria Constituição, que prevê, no art. 7, inciso IV e VII, garantias de proteção aos trabalhadores (BRASIL, 1988). Dessa forma, a Carta Magna de 1988 traz direitos e garantias que regem a Administração Pública, tais como, a de que qualquer cidadão pode ingressar no serviço público, uma vez preenchendo os requisitos legais, através de concurso público, com estabilidade após 3 anos e podendo ser afastado através de um processo administrativo com ampla defesa, como fora outrora mencionado no decorrer da abordagem (BRASIL, 1988).
Além do mais, conclui-se que os ditos “privilégios” instituídos mediante a estabilidade dos servidores públicos se encontram constitucionalizados e através de dispositivos consagrados no Texto Magno de 1988. Por isso, levanta-se a discussão das possibilidades e benefícios da Codificação do Direito Administrativo, seja total ou parcial, para que se evite as influências político-eleitorais na Administração Pública, protegendo a fruição das prestações dos serviços por parte do Estado e garantindo a imparcialidade, bem como a legalidade nos atos estatais e dos funcionários públicos.
Dessarte, conclui-se que a garantia de estabilidade do servidor público, evidentemente, não se configura como um privilégio para eles, mas, sim, faz parte de um instituto que protege as atividades administrativas de influências político-eleitorais e da ocorrência de demissões injustas. O que se tenta fazer ao aprovar a PEC 32/2020 é justamente aumentar os poderes dos chefes do Executivo para que estes rejam a Administração Pública de acordo com suas convicções, usando-se de suas arbitrariedades para isso, mediante a submissão dos servidores a mandatos políticos e retornando gradualmente, o Brasil, ao coronelismo.
Publicado Originalmente: Reforma Administrativa e mudanças no funcionalismo público brasileiro através das influências político-eleitorais