31/03/2023 Ascom Sindifisco-RS
Ex-deputado afirma que atual sistema tributário é perverso e injusto
O Sindifisco RS, dentro do seu Ciclo de Palestras 2023, trouxe a Porto Alegre na última sexta-feira (31) o ex-deputado Luiz Carlos Hauly, um dos formuladores da Reforma Tributária em discussão no país. Hauly é um profundo conhecedor da matéria e um dos parceiros técnicos do Grupo de Trabalho Reforma Tributária na Câmara Federal. É professor de Educação Física e economista formado pela Universidade Estadual de Londrina.
O evento realizado pelo sindicato se insere no objetivo da entidade de acompanhar e contribuir com os debates sobre a reforma tributária no Brasil e, ao mesmo tempo, propiciar a seus filiados e membros das administrações tributárias no Estado as informações mais relevantes sobre o assunto.
Durante a palestra, que foi prestigiada pelo deputado estadual Miguel Rossetto, presidente da comissão especial da Assembleia que irá acompanhar as discussões sobre o tema no Congresso, Hauly apresentou dados, fez comentários a respeito de como a reforma irá ajudar ao país e garantiu que Estados e municípios não irão perder arrecadação ou poder com a aprovação da proposta, considerada por ele neutra.
Além de Rossetto, estiveram acompanhando o evento o vereador Airto Ferronato e o presidente da Associação dos Auditores Fiscais da Receita Municipal de Porto Alegre (Aiamu), Johnny Bertoletti Racic. Grande público esteve presente também na sede do Sindifisco RS e acompanhou igualmente a transmissão pelas redes sociais.
Durante a sua palestra, Hauly teceu fortes elogios ao programa Devolve ICMS, considerado por ele “um projeto genial” desenvolvido aqui no RS, que irá resolver um dos problemas do projeto em discussão de reforma tributária. Segundo ele, não há condições de o Brasil transferir a carga tributária do consumo para a renda a curto prazo. Não há poder no governo para fazer isso. De acordo com ele, o governo passado tentou tributar os dividendos, o projeto chegou no Senado e está lá engaveta. “Aí, o Celso Malhani levou o Giovani (Padilha) e me apresentou esse projeto. Genial. Porque não fazemos uma Nota Brasil para devolver o imposto para as famílias pobres? Uma sacada deste rapaz (Padilha é o autor do projeto Devolve ICMS). Isso aí é o ovo de Colombo: o imposto de consumo, dos impostos sobre o consumo, é devolvido, em parte, para os mais pobres. Porque adotar o sistema americano aqui não tem jeito, não vai ser feito. Então, incorporamos o cashback ao projeto original”.
Por essa razão, o ex-deputado afirmou, durante o evento no Sindifisco RS, que a proposta de reforma tributária em discussão no país está sendo feita para os consumidores. “A proposta é dos consumidores, é feita para as famílias”, afirmou o economista, que é um dos formuladores da Proposta de Emenda à Constituição 110/2019 (PEC da Reforma Tributária) no Senado, assinada por Davi Alcolumbre. Essa proposta embasa o debate e o texto que terá apresentação preliminar no dia 11 de abril.
No seu entender, a reforma é dos consumidores porque quem paga a conta são as famílias, o consumidor final. Não são as empresas que pagam os impostos. Mesmo o Imposto de Renda advindo do lucro vem do consumidor, pois é ele quem paga, é ele quem compra e, assim, colabora para destravar o Brasil, declarou. “Eu vou mostrar que o Brasil está travado e nosso objetivo comum (do GT) é buscar o desenvolvimento, harmonizando o sistema tributário brasileiro”.
Para ele, a proposta será também do governo que aprová-la. “Se o Lula aprovar, ele vai ser o pai da PEC. Porque todos tiveram a chance de aprovar a reforma tributária e perderam a oportunidade. A proposta já vem sendo discutida desde lá de trás, de muitos anos. Na verdade, desde a Constituinte”, disse, salientando que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deixou de fazer (a reforma) por que tinha um secretário da Receita Federal que não deixava fazer nada. “Não mexa no que está dando certo”, argumentava esse secretário para o então presidente. E, assim, o sistema foi se tornando complexo, conta.
Conjugação perversa
Munido de um powerpoint, com dados exclusivos e esclarecedores, o palestrante procurou mostrar que a reforma é viável e que ela “não é uma invenção do Hauly, do Appy (Bernard Appy, secretário Extraordinário da Reforma Tributária)”. Segundo ele, a reforma é a da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) e há mais de 70 anos. “Essa é a burrice brasileira”, referindo-se aos que são contrários à proposta.
O objetivo de todos é o desenvolvimento econômico, com uma harmonização do Sistema Tributário Brasileiro ao da OCDE. “Enquanto o Brasil não harmonizar com a OCDE não vai entrar no clube dos ricos. É uma regra básica de comércio mundial. Eles dizem: teu sistema não bate com o nosso. E o que eu e o Appy estamos fazendo é harmonizar o sistema brasileiro com o deles”, revelou.
Para o palestrante, o Imposto de Renda está ok no Brasil. O sistema patrimonial também. O imposto de consumo é que é um “banzé no Oeste”, o sistema mais inimigo, injusto e caótico no mundo, gerando um desemprego crônico, afirma. Isso porque, como opinou, mata o salário líquido e mata o poder de compra das famílias. Uma conjugação perversa de injustiça fiscal e social.
E há mais razões para reformar. Vejam o que vem acontecendo da época da Proclamação da República até 1930, lembra o palestrante: o Brasil cresceu a 4.8%. “Por 42 anos crescemos a essa taxa anualmente. De 1931 a 1980 o Brasil cresceu o dobro dos Estados Unidos e olha que os EUA já eram uma potência”, aponta.
Baixo crescimento econômico
No entanto, a partir de 1981 o país capotou. Foi a primeira grande crise, quando no governo do General Figueiredo, o então ministro da Fazenda Delfim Neto deu um tombo na economia de 8,5% do PIB. “Aí, nós fizemos movimentos políticos, os militares também não queriam mais, e resultou na abertura política, diante de uma economia que tinha sucumbido. Veio então a Nova República e não fez todas as reformas. Em seguida, a Constituinte de 1988, quando surgiu a PEC 48”.
Tentávamos então (na Constituinte), conta Hauly, corrigir o sistema tributário criado em 1965 (Emenda Constitucional 18), que havia produzido um sistema híbrido completamente diferente do adotado na Europa. O imposto de valor agregado teve divida a sua base (consumo) em três: foi dado o serviço para o município, os bens para o Estado e um adicional de bens do IPI para o governo federal, que ao longo dos anos foi criado outras contribuições. “O governo federal criou também um novo Imposto de Renda disfarçado de contribuição e esse jeitinho brasileiro, esse arranjo mal elaborado, veio destruindo a economia brasileira porque mexeu com o imposto de consumo, isto é, com as empresas”. A carga tributária foi crescendo e interferiu na formação de preços relativos e na concorrência. “Daí o fracasso do crescimento econômico nesses últimos 42 anos. O crescimento está por ali 2.2, mas é 2%. E nos últimos dez anos é zero, entre os anos negativos e positivos. Na década de 2011 e 2020, o mundo cresceu 2,7 ao ano. E os nossos concorrentes 4%. No Brasil foi zero. Ainda tivemos uma década boa, a de 2010, a do então presidente Lula. Mas agora, estamos dez anos sem sair do lugar”, se indigna o palestrante.
Os outros (países) estão correndo na frente, assegura. A China até 1980 não era nada. O Brasil tinha quase 4% da economia do mundo e hoje o Banco Mundial considera o Brasil o pior sistema tributário do mundo. Entre 190 países medidos, estamos em 113ª lugar. O ambiente de negócio do Brasil caiu para 124º. “Ora, o Brasil é o quinto maior território do mundo, a sexta maior população do mundo e hoje está em 12º no PIB, mas já foi sexto, sétimo, oitavo e se nós temos a sexta população e o território mais rico do mundo (porque os Estados Unidos já exploraram tudo e a China não tem mais nada para explorar de minerais, terras), então temos todas as condições para produzir, para explorarmos. E como nós não crescemos? Onde está o problema? No atual sistema tributário. Esse é o drama do Brasil e chegou a hora de mudar”.
Carga sobre o consumo
Hauly fez uma comparação entre a cobrança de impostos no Brasil, nos Estados Unidos e na OCDE. De acordo com ele, a carga tributária nestes três grupos tem os seguintes números: enquanto nos EUA a carga representa 27% do PIB, no Brasil é de 33% do PIB e na OCDE, de 34%. Mas o peso dos impostos é de 40,6% (consumo/folha) nos EUA, de 60,4% (consumo/folha) na OCDE e de 75,8% (consumo/folha) no Brasil.
Quanto ao Imposto de Renda, os números falam novamente contra o atual sistema tributário brasileiro. Enquanto na OCDE a carga tributária é de 34,1% (base renda), nos EUA é de 49,1% e no Brasil é de 20,8%.
Então, nos 35 países mais ricos e os Estados Unidos, que a Meca do consumo do capitalismo no mundo, a base é a renda e o patrimônio. Daí decorre que, em qualquer crise, principalmente nos EUA, o país é o primeiro a sair das crises. Porque eles pagam menos impostos sobre o consumo e então acabam consumindo mais, gerando mais renda e, por consequência, geram um círculo virtuoso.
O GT da reforma tributária deverá apresentar o texto preliminar da proposta no dia 11 de abril, quando serão conhecidos os pontos de consenso na reforma, como a implementação do IVA e a proibição da cobrança de impostos em cascata. Um outro encontro também está acertado para o dia 14 de abril, quando o relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), apresentará uma versão mais ampliada do projeto.
O ciclo de palestras 2023 do Sindifisco-RS tem por objetivo proporcionar aos filiados da entidade oportunidades únicas de ampliarem conhecimentos sobre os principais temas que movimentam o país e têm reflexos, diretos ou indiretos, na atuação e desempenho da categoria.
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