12/09/2023 JOTA
“Quanto mais dá desoneração na cesta básica, menos espaço fiscal sobra para fazer o ‘cashback’”.[1] Com essas palavras, o secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para a reforma tributária, Bernard Appy alertou sobre a consequência que uma desoneração ampla sobre bens e serviços pode acarretar à política fiscal de combate à desigualdade de renda.
Em 2021, quase 30% dos cidadãos brasileiros estavam na pobreza. Desse percentual, quase 18 milhões eram extremamente pobres.[2] O que antes era uma clara percepção do simples caminhar pelos grandes centros urbanos – em que pessoas dormem ao relento – já se confirma em inúmeros dados e fontes há algum tempo.
Desde que Thomas Piketty lançou seu “O Capital no século XXI” já não é novidade que a desigualdade de renda só aumenta. Segundo alerta, “uma vez constituído, o capital se reproduz sozinho, mais rápido do que cresce a produção”.[3] Ou seja, em certos cenários, o rendimento do capital se reproduz mais rápido que o próprio crescimento da economia.
A consequência é que o pobre ficará cada vez mais pobre. E se distanciará cada vez mais das maiores rendas, diante da constatação de que a renda do capital se multiplica mais rápido do que a renda do trabalho. Em relação ao trabalho, quando o tem, o pobre vive a constante ameaça do desemprego. Basta uma crise econômica para perder o seu. O medo lhe é um eterno companheiro. Em relação ao capital, esta expressão não integra seu cotidiano.
Amartya Sen alerta para o fato de que a pobreza não se relaciona apenas com a desigualdade de renda. Não é apenas uma questão econômica. É uma questão de privação de capacidades. Outros fatores, como idade da pessoa (jovem ou idoso), papéis sexuais e sociais (maternidade), localização (bairros violentos, regiões de seca ou inundação), que não necessariamente estão ligados às escolhas das pessoas, podem influenciar a pobreza.[4]
A reforma tributária deveria olhar com mais cuidado para essa situação. Pessoas estão deixando de ser pessoas. Pessoas estão morrendo de fome. Mas a ideia parece ser a de que é preciso haver uma troca para se dar algo ao pobre. Se ele consumir, ele ganha dinheiro de volta. Essa é a moralidade que impulsiona a economia da pobreza. Mas, e se ele não tem condições de consumir nada?
Publicado originalmente no JOTA Leia mais (O acesso à matéria pode exigir assinatura pessoal).